Daniel
Späth
A
“frota de ajuda” de Gaza e o estatuto precário do Estado de Israel
nas
reacções da esquerda alemã
O
estado mental de uma sociedade não raramente pode ser lido na disposição teórica
de seus pretensos “intelectuais”. A crise fundamental não se limita de modo
algum à reprodução material, é também uma crise de pensamento e de acção,
como mostra, além de Peter Sloterdijk, que agora defende o seu ponto de vista
elitista de forma abertamente racista, (1) também Jürgen Habermas, cujo
fetichismo democrático, tendo presente a sua origem teórica, faz dele
necessariamente um verdadeiro artista do recalcamento.
Outro
“intelectual” deste tipo, o escritor sueco Henning Mankell, andou
recentemente ocupado com a agitação num aspecto diferente. Participante da
“frota de ajuda a Gaza”, ficou prisioneiro de Israel, após o que não
deixou de assumir que não perde uma oportunidade de expressar mediaticamente a
sua opinião sobre o conflito israelo-palestiniano, como aconteceu numa
entrevista à Spiegel. À pergunta sobre se o Hamas seria para Mankell uma fonte
de esperança na Faixa de Gaza – afinal a solidariedade com a população da
Faixa de Gaza está para além da solidariedade com o Hamas, por ela
democraticamente eleito – Mankell respondeu: “Eu sou extremamente crítico
do Hamas. A evolução política na Faixa de Gaza não se encaixa comigo. No
entanto, sei muito pouco sobre isso.” (2) Ora a grande proeza é que,
precisamente a Faixa de Gaza, que o Hamas controla, se tenha tornado o cenário
das manifestações de solidariedade.
Mankell
já antes tinha escolhido as mesmas palavras, num evento no Volksbühne [teatro
popular] de Berlim: “Ao mesmo tempo, ele seria naturalmente ‘muito crítico’
para com a organização palestiniana radical Hamas, mas as conversações com
ela teriam de existir, a fim de se resolver o conflito no Médio Oriente.”
Quando lhe perguntaram como, Mankell respondeu: “Não sei.” (3) Já não se
constrói o mínimo distanciamento reflexivo entre “a favor” e “contra”,
ambas as posições coincidem imediatamente. O que é completamente omitido é o
carácter abertamente anti-semita do Hamas, que fez da destruição do Estado de
Israel o fundamento da sua existência – facto que, no entanto, não deverá
afectar nada um inimigo de Israel como Mankell. (4) Mas esta falsa identidade
entre a crítica ao Estado de Israel, por um lado, e a afirmação irreflectida
das forças que querem destruir precisamente este Estado (forças cuja aniquilação,
pelo contrário, seria uma condição prévia para a paz no Médio Oriente), por
outro, continua a não ser exclusiva da intelligentsia
burguesa; a maioria da esquerda do movimento contribuiu em parte significativa
para a onda anti-semita que abalou o mundo, no curso da acção militar
israelita contra a “frota de ajuda” de Gaza.
Já
se poderia ter percebido que Mankell não tem problemas com o anti-semitismo,
bastando para isso ter presente o fundo anti-judaico da organização “Insani
Yardim Vakfi (IHH)”, a partir da qual, sobretudo, foi recrutada a tripulação
do navio almirante da frota - o “Mavi Marmara”. Se, nestas condições, a
organização trotskista “Sozialistische Alternative Voran” (SAV), num relatório
sobre uma manifestação contra a acção militar israelita, anuncia que
“estes navios queriam levar suprimentos pacificamente (!) à Faixa de Gaza
totalmente bloqueada” (5), trata-se de uma paródia sobre a problemática real
desta acção realizada por anti-semitas. (6) À semelhança de Mankell, a comoção
anti-semita reprime aqui a capacidade de reflexão e de diferenciação, do que
resulta aquela horrível indiferença perante os promotores desta acção e,
finalmente, a solidariedade expressa para com os anti-semitas assumidos (7), que
na sequência do texto também são chamados de “activistas pacifistas” (8).
O
que aqui ressoa apenas implicitamente é em seguida formulado mais claramente
noutro sítio: Como acontece com muitos movimentos anti-imperialistas, também a
SAV nega em última instância o direito à existência do Estado de Israel, ao
limitar-se a subsumi-lo trivialmente na categoria de “Estado capitalista”:
“Só um movimento colectivo de palestinianos e palestinianas com judeus e
judias israelitas contra o Estado capitalista de Israel pode garantir novos
ataques e direitos democráticos para todos.” (9) A ânsia de deixar o
ressentimento anti-semita correr livremente pode às vezes levar até a omitir
uma ou outra credencial. Que esta frase venha de um representante do Comité
Internacional da SAV, que tem assento no Parlamento Europeu, mostra para onde
vai a Internacional trotskista – só podemos estar contentes por essa organização
anacrónica em matéria de crítica social radical não ter dito uma palavra a sério
sobre o tema. (10)
Esta
argumentação unidimensional renuncia à avaliação crítica do estatuto
paradoxal do Estado de Israel, que de modo nenhum fica absorvido no atributo de
“Estado capitalista”. O facto de neste caso não se tratar simplesmente de
um Estado qualquer, mas do refúgio para judeus e judias, em resposta tanto ao
horror de Auschwitz como ao anti-semitismo global de hoje, tal ideia está longe
do movimento anti-imperialista e deverá continuar muito distante, se a forma
ideológica do anti-semitismo é e continua a ser percebida como “cola ideológica”
(11), através da insuficiente grelha de percepção do marxismo tradicional, ou
seja, como mera manobra táctica da “classe capitalista” subjectivamente
desalentada para doutrinar a “classe trabalhadora”, e não como construção
ideológica burguesa genuína, que atravessa toda a socialização capitalista.
O facto de, há apenas alguns meses, textos que tentaram apresentar
conceptualmente as fases de transformação do anti-semitismo global terem sido
denunciados como “anti-alemães”, de forma completamente inesperada e sem
qualquer justificação, mostra quão profundamente enraizada está esta velha
grelha de percepção, mesmo no contexto da crítica da dissociação e do
valor.
Aqui
se apura também, na sequência dos acontecimentos da “frota de ajuda” de
Gaza, que a posição anti-alemã não pode ter qualquer interesse numa análise
séria do anti-semitismo global, no contexto de crítica social radical.
Se
para o seu (super)pai teórico, Adorno, a pretensão de resolver o resto da
positividade burguesa estava pelo menos ligada à “dialéctica negativa”, a
maior parte do movimento anti-alemão instrumentaliza o anti-semitismo para
fazer de conta que ignora a negatividade universal do patriarcado produtor de
mercadorias. É o caso da fanfarronice da redacção da Bahamas sobre que
“conteúdo positivo poderia significar: pela igualdade de direitos das
mulheres e das jovens em toda a parte, pela sexualidade livremente exercida de
todos os membros de cada sociedade, pelo primado do indivíduo contra as imposições
da cultura, da religião ou da comunidade.” (12) Os defensores “da cultura,
da religião e da comunidade” não são mais percebidos como portadores de uma
falsa consciência, mas sim definidos simplesmente como imagem do inimigo. De
seguida, trata-se de combater também esta imagem com as receitas iluministas de
homem branco ocidental: “Não deveriam os padrões obtidos aqui no Ocidente e
naturalmente insuficientes [a conversa é sobre humanismo e liberdade, DS] ser a
base de qualquer solidariedade entre as pessoas da metrópole e da periferia,
como se dizia dantes?” (13) Como isso não quer funcionar assim tão bem
agora, na crise, resta apenas ao ressentimento anti-alemão defender os “padrões
ocidentais” onde eles ainda existem, em condições cada vez mais precárias.
Também
o anúncio de uma palestra da redacção da Bahamas mostra que o movimento
anti-alemão se sente na obrigação de se apresentar cada vez mais
descaradamente como ponto de atracção para os sujeitos do sexo masculino e
brancos. Na palestra, intitulada “Ulisses agrilhoado. Uma palestra sobre sexo,
Jihad e despotismo” deveria tratar-se da “crítica impiedosa do patriarcado
‘estrutural’ islâmico” (14), em que este, no prosseguimento do texto, é
qualificado “não só” como um patriarcado “ainda assim principal”, se não
“exclusivo”: “Este evento irá abordar, por outro lado, a posição das
mulheres conformadas com a Sharia em público e no meio familiar, tematizar a
diferença entre subjectividade ocidental e islâmica e apresentar a defesa não
apenas feminista do Ocidente contra toda a arrogância oriental.” (15) É tão
simples esquivar-se ao problema do sexismo burguês como sujeito masculino
ocidental. Parece ser uma especialidade dos anti-alemães retirar do seu
contexto clichés de crítica do capitalismo de esquerda – e, na verdade, a
maior dificuldade para uma crítica do capitalismo actualizada parece ser o
feminismo radical, além da crítica fundamental da filosofia iluminista – e
modificá-los no seu interesse apologético, acabando assim por distorcê-los.
Enquanto
a ideologia anti-alemã desligar o islamismo da dialéctica da história e negar
a sua substância pós-moderna, para o fixar como negatividade ahistórica
existente em si, não pode de forma alguma compreender criticamente o
anti-semitismo global; seja ele o dos radicais islâmicos ou o dos
representantes da comunidade democrática ocidental de bombardeamentos (sobre o
qual há significativamente mais silêncio em suas fileiras).
Assim
se transforma a pretensão rotulada de crítica radical pelos teóricos e teóricas
anti-alemães em apologética burguesa por excelência, “atrás das costas”
(Marx) dos seus actores: o constructo ideológico de um mundo islâmico
regressivo, que sempre volta a ser exercitado, serve em última instância para,
na pior tradição do Iluminismo, continuar a conduzir a cruzada da secularização
e da crítica da religião contra estes aparentes fanáticos religiosos, o que não
tem nada a ver com a crítica do capitalismo, muito menos radical.
Pois
o pensamento na lógica da identidade, no caso dos anti-alemães fixado no
Estado de Israel, como é sabido, rompe-se na negatividade universal do
patriarcado produtor de mercadorias, que naturalmente também determina a forma
de acção deste Estado, e essa ruptura necessita de cobertura ideológica, para
não vir claramente à luz do dia tal como é. Assim se esconde o núcleo
violento precisamente da forma de Estado. Numa declaração sobre os confrontos
sangrentos entre a chamada “Frota de ajuda de Gaza” e o Exército israelita,
diz-se: “A redacção da Bahamas não entende nada de estratégia militar e não
pode apresentar boas propostas para a acção militar em guerras irregulares.”
(16) Comoventes, estas boas pessoas. Se a Bahamas não fosse bem conhecida, com
base na aprovação permanente e brutal do terror e dos assassinatos da
comunidade de Estados democrática ocidental do decurso da “guerra de
ordenamento mundial” (Robert Kurz), poder-se-ia pensar que se tinha passado
para os pacifistas. Na verdade, essa ignorância hipócrita serve naturalmente
apenas para negar o núcleo violento da forma Estado – que provavelmente é
considerada uma das “realizações ocidentais” – incluindo também do
Estado israelita. (17) Com estes pressupostos, não pode entrar no campo de visão
o problema da razão de Estado, pelo qual somente é gerida a política de
Israel, sendo também esse o motivo por que o próprio Estado de Israel não
pode combater o anti-semitismo com seriedade, em suas decisões estratégicas.
(18) Este contexto do problema passa completamente despercebido nas construções
dos anti-alemães.
O
facto de o Estado de Israel cometer erros de cálculo estratégico, naturalmente
também sob a ameaça do anti-semitismo global cada vez maior, tem a sua razão
por assim dizer na questão desta forma de existência capitalista em si mesma.
O erro de avaliação dos funcionários do Estado foi a causa não apenas de o
Hamas ser preferido à Fatah, como parceiro de aliança (19), mas também da acção
em alto mar, contra a “frota de ajuda”.
Pois
do ponto de vista jurídico, que constitui basicamente o espartilho teórico da
razão de Estado, é até possível que o exército de Israel tenha agido
legalmente. Um relatório de síntese do Serviço Científico do Parlamento
Federal chegou à conclusão de que os bloqueios podem ser lícitos em águas
internacionais: “Um bloqueio legítimo constitui nessa medida uma excepção
ao princípio da liberdade de navegação em alto mar” (...). O bloqueio naval
seria “um método de condução da guerra reconhecido pelo direito
internacional consuetudinário”. (20) Uma vez que o bloqueio naval apenas é
legítimo em “conflito armado internacional”, o estatuto legal da abordagem
depende da definição do conflito israelo-palestiniano, que certamente pode ser
designado como conflito internacional. Parece, portanto, que a forma legal
burguesa não pode ser de modo algum uma instância competente para a apreciação
da acção militar israelita (pelo menos para o pensamento crítico), pelo contrário,
torna-se claro que a onda anti-semita, desencadeada por este acto
deliberadamente provocatório da “frota de ajuda a Gaza”, foi desenvolvida através
dessa forma; e a forma jurídica, tal como a forma estatal, não são de modo
algum opostas às figuras de pensamento e padrões de acção anti-semitas –
pelo contrário, elas são interdependentes e não podem, pois, ser jogadas umas
contra as outras. A ignorância hipócrita da redacção da Bahamas, como é
manifesta na citação acima, no seu esforço para tornar essa relação
irreconhecível, está condenada à impotência, uma vez que não está em situação
de tomar nenhuma posição para além destas alternativas. Com isto, no entanto,
e neste ponto a redacção da Bahamas deve ser mencionada como paradigma da
maior parte do movimento anti-alemão, ela regride ao ponto de vista da transfiguração de Israel [Israel-Verklärung], ponto de vista que
se revela como o que sempre foi subliminarmente: um anti-semitismo disfarçado.
É
o que mostra o facto de se pretender que seja precisamente o Estado de Israel a
servir como ponto fixo identitário de uma modernidade ilusoriamente avançada
contra o islamismo religioso supostamente pré-moderno. Se o Estado de Israel,
como “o mais vulnerável representante” da “civilização”, está sendo
instrumentalizado para afastar o “mal-estar na civilização” (21), essa
equiparação entre Israel e a civilização é não apenas lógica de
identidade em bruto, mas também ideológica de uma ponta à outra, pois foi
precisamente a civilização ocidental que produziu o quase extermínio dos
judeus europeus e é ela que hoje coloca cada vez mais em causa a existência do
Estado de Israel. Além disso, com este esquema de argumentação já não se
está em posição de poder entender e avaliar adequadamente as mudanças da Realpolitik
em Israel.
Não
se pode simplesmente ignorar, em favor de fantasias próprias, que o racismo no
interior de Israel atingiu o seu auge o mais tardar em junho deste ano, com a
manifestação dos chamados Ashkenazi – trata-se dos judeus ultra-ortodoxos
migrantes da Europa (oriental) – contra o fim da separação nas escolas entre
os seus filhos e os judeus sefarditas, dos quais a maioria tem antecedentes
familiares árabes. O facto de a crescente desintegração do Estado de Israel,
na esteira da crise do capital mundial, produzir potenciais de barbarização
dentro de Israel irá conduzir a qualquer momento o pensamento anti-alemão na lógica
da identidade de um raciocínio crente no pólo do Estado e da civilização
para o pólo oposto do incompreendido carácter dual do Estado judaico,
culpabilizando “os judeus” em si por estes processos.
Mas
o pensamento na lógica da identidade dos anti-alemães também noutro aspecto
fica para trás do real desenvolvimento social global. Se até aqui pôde
parecer que os Estados Unidos apoiavam Israel por razões de solidariedade, com
a chegada da administração Obama esta tese já não é defensável. É uma
novidade na política americana dos últimos anos que o Presidente americano
tenha estabelecido contacto com o Hamas através dos serviços secretos. O que,
por sua vez, coloca perante uma tarefa quase impossível o pensamento anti-alemão,
que considera a América em aliança com Israel como a ponta de lança da
civilização ocidental contra a “barbárie islâmica”. Porém, uma vez que
tem de se explicar a realidade de alguma maneira, e não é possível
esconder-se permanentemente atrás das muralhas ideológicas da ignorância hipócrita,
é preciso também betumar esta brecha no movimento de reflexão próprio. É
assim que uma recente edição impressa da Bahamas titula em manchete
“Conspiração contra a América?” Parece impossível que uma redacção,
que a todo o momento se apresenta em cena como lutadora contra o anti-semitismo,
se presenteie a si mesma com teorias de conspiração para explicar a mudança
social: é a prova de que o movimento anti-alemão está prestes a virar-se de
uma hiperidentificação com o Estado de Israel para um anti-semitismo
(estrutural) (o ponto de interrogação no título de modo nenhum afasta a
sugestiva intenção).
Os cabecilhas desta conspiração deveriam ser, de acordo com a Bahamas, Barack Obama e a sua equipa de liderança. Segundo o editorial do mesmo número da revista, um acto dessa conspiração teria consistido em que “na primavera foi de novo preenchido pelo Presidente um lugar de juiz no Supremo Tribunal Federal. Ele nomeou Sonia Sotomayor, que os partidários dos republicanos acusam, pelo seu empenho social e pela sua actividade judicial no tribunal federal de apelação de Nova York, de ter adoptado um perfil de centro-esquerda e ter lutado tão enfaticamente pelas minorias que, em contrapartida, discriminaria a maioria branca.” (22) Esta citação não é apresentada a partir de um fundo de crítica, mas comentada com aprovação. O anti-semitismo estrutural da teoria da conspiração é acompanhado por um racismo aberto – só podemos esperar que este seja o ponto mais baixo da “elaboração teórica” anti-alemã. Na realidade da crise em curso torna-se cada vez mais claro qual é realmente o espírito desse movimento: “Quem entende por liberdade e felicidade algo diferente de gestão da pobreza, miséria colectiva coerciva generalizada e mobilização permanente contra inimigos externos deve, portanto, opor-se à aliança entre a Jihad e o socialismo. Neste sentido, a solidariedade com Israel é, no melhor sentido, egoísta.” (23) Realmente, não era preciso ter sido tão claro, também já se tinha percebido.
Naturalmente
que a mudança de posição da política externa americana em relação ao
Estado de Israel não deve ser justificada com a pessoa de Barack Obama nem com
a sua entourage. (24) A luta cada vez
mais desesperada do “imperialismo global ideal” (Robert Kurz), cujo esforço
militar e financeiro continua a ter de ser suportado principalmente pelos
Estados Unidos, empurra o governo americano cada vez mais para um impasse político;
o seu poder político minguante leva-o inevitavelmente à busca de novos
aliados, incluindo no mundo árabe – daí decorre uma desvalorização das
relações com o Estado de Israel. Só assim se podem entender as palavras de
Obama de que uma “solução para o conflito no Médio Oriente é de
‘interesse vital para a segurança nacional’ do seu país” (25) Esta
declaração deve ser entendida apenas na constelação objectiva da crise do
capital mundial, da consequente dificuldade das finanças públicas dos Estados
Unidos e da impotência militar que daí resulta; uma evolução já antecipada
por Robert Kurz em seu livro “Weltordnungskrieg [A guerra de ordenamento
mundial]”: “Numa situação global agudizada não é de modo algum impensável
(embora na actualidade nada para aí aponte) que o ‘imperialismo global
ideal’ deixe cair Israel e abra a válvula do anti-semitismo, tendo em vista
as suas contradições internas.” (26).
Seja
pela rejeição aberta do direito à existência de Israel da parte da
“Sozialistischen Alternative Vorwärts” – um exemplo representativo do
movimento anti-imperialista – seja por um anti-semitismo estrutural em
desenvolvimento da parte dos anti-alemães: mais uma vez o Estado de Israel e os
judeus e judias de todo o mundo parece que não devem esperar qualquer
solidariedade da esquerda (alemã). Assim sendo, é tempo de desenvolver uma
teoria que possa fazer frente às diferentes formações ideológicas, sem as
equiparar: Uma teoria que não abuse da luta contra o anti-semitismo para
legitimar a própria forma de sujeito, que não instrumentalize o sexismo cada
vez mais evidente para projectá-lo nas zonas muçulmanas do mundo, e que aceite
o Estado de Israel como refúgio para os judeus e judias sem o equiparar com
essa forma de existência.
Notas
1.
Vd. Udo Winkel, Marx-Diskurse in der Krise. Ein
kleiner Streifzug [Abordagens de Marx na crise. Uma pequena incursão],
in: Exit! Krise und Kritik der Warengesellschaft 6, p. 252 sg.
6.
Este equívoco pode ser explicado pelo facto de essa organização ter passado o
tempo mais na distribuição de panfletos e na venda de rua do seu jornal – a
verdadeira especialidade da SAV – do que a analisar a provocação do ponto de
vista da crítica da ideologia.
10.
Tais declarações não podem ser relativizadas por outro artigo na homepage
da SAV, que concede ao Estado de Israel o direito de existir. A presença
conjunta de tais posições diametralmente opostas na mesma homepage
já indica que a pretensão parcialmente formulada de luta contra o
anti-semitismo é só fumaça e jogo de espelhos.
Original
Die
„Hilfsflotte” von Gaza und der prekäre Status des Staates Israel in den
Reaktionen der deutschen Linken
in
www.exit-online.org. 06.09.2010.