Alguns comentários sobre a dialéctica da alienação

 

Helen Akin

 

HAMM: Não estamos começando a...

a ... significar alguma coisa?

CLOV: Nós, significar? (Riso breve)

 Ah! Essa é boa!1

 

I.

Nos actuais artigos sociológicos e filosóficos sobre a alienação, prescinde-se de incluir na teoria a própria profissão, a própria especialização, para já não falar da própria pessoa. Procede-se com se aquilo sobre que se escreve não dissesse respeito ao próprio. Os alienados são sempre os outros; casos que se podem apontar, analisar e provar como alienados. Mantém-se a tese da objectividade da alienação, de que a causa dos modernos fenómenos de alienação não reside na vontade e na percepção do sujeito, mas no carácter sistémico e nas estruturas independentes da moderna organização capitalista. Esta objectividade é afirmada sem se ver qualquer contradição com a sua própria práxis de individualização teórica e metodológica: A enumeração de casos individuais reais ou inventados de alienação, que supostamente são a prova da sua continuação. As teorias da alienação desintegram-se em duas partes: Uma parte consiste numa breve recapitulação das teorias tradicionais da alienação – outra em estudos de casos, para cuja crítica não teria sido realmente preciso examinar a revisão da teoria.

Por um lado, a alienação é individualizada – algumas pessoas são alienadas e outras não – e, por outro lado, é afirmada a sua causa objectiva, enraizada nas estruturas sociais. Diz-se então que certas condições sociais empurram as pessoas para uma relação de alienação de si próprias, do mundo e dos outros, e que estas tendências de alienação são actualmente mais "eficazes" do que nunca. A afirmação de condições estruturais objectivas de alienação parece que teria de afectar também a pessoa que as descreve – partindo do princípio de que ela participa de algum modo na sociedade em questão. Afecta-nos a todos, embora certamente todos e cada um de nós de formas bastante diferentes. No entanto, nas descrições de casos das actuais teorias da alienação, a alienação – contrariamente à declaração de querer criticar as suas condições sociais estruturais – aparece antes como uma excepção ou desvio, como um caso patológico de uma sociedade que de resto seria "saudável". Os fenómenos de alienação enumerados como exemplos pretendem representar momentos de um contexto global, sem passar pela mediação que, como particulares, os legitimaria para se tornarem imagens representativas de estruturas e desenvolvimentos gerais. Atravessa-se um mar de normalidade em busca de provas da persistência de fenómenos de alienação e acaba-se por apanhar algum lixo: relações laborais precárias, novos desníveis de desigualdade, depressão, burnout etc.

A tentativa de Marx foi analisar como a compulsão de vender a própria actividade dentro de uma estrutura que se esforça por dela retirar o máximo lucro possível danifica essa actividade nas suas possibilidades. Para encontrar uma actividade em que tais danos possam ser demonstrados, não creio que se tenha de atravessar nenhum mar.

 

II.

Que nos encontramos a nós próprios e uns aos outros de maneira alienada significa, antes de mais, em termos gerais, que algo não bate certo nas relações em que vivemos. Em filosofia, a coerência, o acordo ou a rectidão (ὁμοίωσις) de uma coisa é tradicionalmente chamada verdade. Assim, podemos também compreender relações em que "algo" não bate certo como falsas relações. Esta é a famosa formulação de Theodor W. Adorno, que escreve nas suas Minima Moralia que uma vida verdadeira não é possível numa vida falsa.

A tese de uma tal alienação geral (nas modernas sociedades produtoras capitalistas) parecerá à maioria estranha, certamente exagerada e talvez até irritante. Todo o tipo de coisas, todas as pessoas que alguma vez conhecemos, o mundo inteiro pode tornar-se temporariamente estranho para nós – mas como pode ser possível que estejamos alienados de nós próprios? Não seremos nós necessariamente a pessoa que somos? Não conhecemos ninguém melhor que a nós, ao que parece, e nada é mais fácil para nós do que sermos "humanos" – porque o somos, dia após dia, e desde logo não há nada de questionável ou duvidoso sobre isso. A afirmação de que no decurso do iluminismo europeu e da revolução industrial que ele tornou possível – que se baseou numa cadeia de actos de acumulação original, dividiu a sociedade em classes e fez do trabalho assalariado a categoria central – entrámos num modo de actividade económica, de organização social e política, que não corresponde nem a nós humanos nem à Terra que habitamos, não é plausível – não merece aplausos (latim: plaudere). As pessoas abanarão a cabeça e responderão que um diagnóstico tão universal é inapropriado para os nossos tempos tão complexos, plurais e democráticos, e que também se deve ver os progressos que foram feitos. Não se nota, contudo, que a tentativa de quebrar conscientemente as regras do que se pode dizer e pensar nunca foi "apropriada" – é na própria tese da alienação que se fundamenta que ela tem de ser inoportuna.

Tais avaliações depreciativas – a teoria da alienação de Marx é "problemática", "quase anacrónica", ou "questionável"2 – podem, portanto, ser consideradas menos como críticas do que como uma indicação de que ele pode ter realmente conseguido sair do espaço de valores e justificações reconhecidos, ao encontrar uma linguagem que, como ele escreve, deixa para trás a linguagem das coisas, a única que ainda conseguimos compreender.3 A sua intenção, afirma ele explicitamente, era ir contra as regras estabelecidas pela economia e pelo empreendimento científico positivista. Perante este procedimento explícito, não deveria ser considerado despropositado "pôr em ordem" o seu projecto – traduzi-lo de novo nos nossos modos convencionais de conceber e em conceitos conhecidos? Tornar prático o que foi pensado como combativo?

 

III.

Uma das objecções à afirmação de uma alienação geral retira a sua legitimidade da lógica e da etimologia do termo.

Vamos primeiro cingir-nos ao significado comum de alienação como tornar alheio. Isto expressa uma relação, e, na medida em que as relações (consigo próprio, com os outros, com a natureza etc.) são assumidas por sujeitos, sendo inerente a estes que por sua vez se coloquem num relacionamento com estas relações – para as qualificar como próximas, estranhas, apropriadas, bem sucedidas etc. – é óbvio que temos de começar inevitavelmente por um sujeito que experimenta, sente, exprime etc. uma alienação. Uma pedra – deitada ao pé de uma montanha – não pode estar alienada do seu "fazer", e uma planta não se pergunta se é correcto ou apropriado abrir as suas flores em direcção ao sol. Nós, pelo contrário, como seres humanos podemos entrar numa relação (de avaliação, de questionamento, de compreensão ...) com as condições em que nos encontramos, e por esta razão o discurso da alienação só faz sentido para nós.

Ao descrever uma coisa como alienada, alheia ou alienante, nós (supostamente) atribuímos-lhe o alheamento como uma qualidade. Onde a experiência do alheamento está ausente, tudo parece familiar; nada nos irrita e talvez por causa desta ausência de fricção, nada mais nos impressiona e continuamos a viver.

Se, por exemplo, algo se nos tornar alheio a ponto de se tornar incompreensível, o efeito alienante desdobra-se em momentos que não aparecem sob a forma de compreensibilidade, que supostamente aparecem sem qualquer forma – informes.4 Contudo, assim que conseguimos avançar mais uma vez para a coisa em si, conhecendo-a e aprendendo a compreendê-la – tal como podemos aprender uma língua estrangeira ou ganhar uma nova confiança num amigo temporariamente afastado – ela já não aparece como alheia. Torna-se então evidente que o alheamento desta coisa não era de todo uma qualidade, mas apenas uma aparência temporária, uma certa aparência de que se revestia para mim. A coisa parecia-me estranha apenas do ponto de vista específico que eu tinha em relação a ela; mas "por si só" ou "de acordo com a sua essência" não é estranha.5

Vemos que o significado específico que a caracterização de uma coisa como alienada, alheia ou alienante pode conter está normalmente ligado de um modo particular à perspectiva da pessoa que a descreve – eu estou alienado de Pedro, mas você pode não estar; Sabine está alienada da sua casa paterna, mas a sua irmã pode não estar; o francês é uma língua alheia para si, mas pode não ser para mim etc. – e neste sentido está ligado à expressão deíctica, de modo a que se revela realmente difícil e pode assim ser considerado uma coisa completamente esquisita riscar simplesmente o sujeito que fala e afirmar simplesmente uma alienação objectiva digna de crítica. A tendência individualizante de querer provar fenómenos de alienação com base em estados de espírito subjectivos, tais como experiências de sofrimento ou perturbações mentais diagnosticáveis, deriva a sua plausibilidade desta utilização comum do conceito.

Para Marx e Adorno, pelo contrário, o critério para diagnosticar a alienação nas sociedades modernas não recai sobre o sujeito; o conceito de alienação de Marx desde o início que não foi – ou não foi primariamente – orientado para experiências subjectivas de alienação.

Isto não significa que o ponto de vista, o modo de vida, as perspectivas das trabalhadoras e trabalhadores assalariados fossem irrelevantes para as descrições de Marx – pelo contrário. No entanto, a sua abordagem não é de natureza empírica – ele não pergunta: quanto ganham a trabalhadora e o trabalhador assalariados, quanto tempo trabalham, que diferenças experimentam em relação às suas origens sociais etc. – nem psicológica: não se preocupa em "pôr-se no lugar" dos trabalhadores ou empatizar com o seu sofrimento. O facto de para os trabalhadores a coisa não estar particularmente "bem" é algo que até mesmo os economistas deveriam ter prontamente entendido – se tivesse sido uma questão de fornecer tal prova, o lumpenproletariado teria-se-ia oferecido para tratamento de forma muito mais eficaz. Marx, contudo, parece estar preocupado em fazer com que as e os economistas vejam algo que não pode ser visto do seu próprio ponto de vista, e que está ligado à actividade, à execução e à manifestação do trabalho assalariado – e não a casos individuais, seleccionados, particularmente maus.6

A alienação não anda necessariamente de mãos dadas com um sofrimento evidente – pelo contrário, também pode parecer ao indivíduo como ausência de sofrimento e de sentimento, como bem-estar ou auto-afirmação.7 O critério da alienação – para Marx tal como para Adorno – está do lado objectivo: é o modo de produção capitalista que força a grande maioria das pessoas a estabelecer relações laborais assalariadas, uma forma de actividade não livre e unilateral que, devido a pressões de crescimento sistémico, força necessariamente aqueles que são apanhados na mesma a uma concorrência permanente e à sobreexploração dos recursos naturais.8

Mas mesmo que o conceito de alienação seja fundamentado na teoria social e lhe seja dado um estatuto geral, normativo e analítico, continua a ser a expressão de uma relação, e uma relação precisa de relata, precisa de pólos entre os quais se possa estender como relação.9 Onde quer que se fale de alienação – aqui reside o momento da verdade das críticas e críticos do essencialismo, aos quais gostaria agora de me dirigir brevemente – o "de quê" da alienação tem de ser determinado de algum modo.

 

IV.

Quando se fala de alienação no contexto marxista, servem geralmente como principal ponto de referência os primeiros escritos de Marx, especialmente os Manuscritos Económico-Filosóficos (1844) e nestes a secção sobre O Trabalho Alienado. Uma das mais poderosas interpretações e críticas deste escrito inicial foi apresentada na década de 1960 por Louis Althusser. Nesta leitura de Marx, hoje geralmente considerada estruturalista, Althusser argumenta que o referido escrito inicial de Marx ainda se baseava em especulações sobre a essência (do latim: essentia, francês: essence) do ser humano, que Marx abandonou mais tarde na Crítica da Economia Política (1859) em favor de conceitos fundamentais radicalmente novos, libertados do essencialismo. Deste modo, Althusser retoma uma divisão da obra de Marx que já tinha sido dominante na pesquisa sobre Marx: desde a sua publicação em 1932, os escritos do supostamente idealista jovem Marx foram demarcados dos ensinamentos tardios do materialismo maduro considerado científico.

Desde "a crítica de Althusser ao ‘humanismo’ de Marx", sublinha Jaeggi, concordando com o consenso, "a crítica do essencialismo tornou-se quase uma espécie de ‘common sense’ da discussão filosófica contemporânea".10 Na minha apresentação darei um passo atrás deste consenso, para começar por abordar previamente a questão: O que significa essencialismo? O que é que os autores anti-essencialistas – especialmente Louis Althusser – entendem por essencialismo ou por essência? A clarificação do conceito de essencialismo deve revelar-se muito trabalhosa, uma vez que nenhum dos autores ou autoras mencionados se aproxima sequer da definição do conceito. Pelo contrário, as observações sobre o essencialismo permanecem, na sua maioria, tão esparsas e vagas que a polémica muitas vezes não leva a lado nenhum, criando pseudo-oposições em vez de argumentar com pertinência. A minha intenção é distinguir quatro níveis possíveis de significado, a fim de sondar o alcance e os limites da crítica do essencialismo: essencialismo como essencialismo aristotélico dum tipo, como idealismo platónico, como naturalismo ou como fundamentalismo. Em Althusser, encontram-se as três últimas determinações do conceito de essência – essência como generalidade prévia, essência como natureza, essência como base. Na minha opinião, no entanto, Marx não era platonista, nem naturalista (no sentido científico actual), nem filósofo da origem.

 

Mas é preciso levar a sério o ataque dos e das anti-essencialistas. Para Marx, o ser humano é um ser-género. Ele diz: Na alienação do capitalismo, alienamo-nos de nós próprios como ser-género. Assim, tudo fica dependente da determinação do que Marx significa com o ser-género.

Marx usa o termo vindo de Hegel e Feuerbach, ao longo da sua secção sobre o trabalho alienado nos Manuscritos. No que diz respeito à forma da frase, parece que nos dá uma definição clássica: "O ser humano é um ser-género". Se separarmos o termo duplo, obtemos uma ligação com genitivo: O ser-género é um ser do género, um ser que se preocupa com os géneros – e, entre outros, com o seu próprio género [humano]. Um ser que se caracteriza por ser capaz de entrar numa relação teórica e prática de compreensão, questionamento, cuidado consigo próprio e com o mundo.11 Diz assim:

O ser humano é um ser-género, não apenas no sentido de que ele, na prática e na teoria, toma como objecto seu o género, tanto o próprio como o das outras coisas, mas também [...] no sentido de relacionar-se consigo mesmo como um género presente e vivo, como um ser universal e consequentemente livre. (MEW 40, p. 514).

Ao falar sobre o ser-género, a sua história, as suas dependências, possibilidades, verdades, a sua alienação, estamos sempre e inevitavelmente a lidar com nós próprios. Não podemos escrever uma teoria do ser-género – uma teoria da alienação na modernidade – sem nos incluirmos nesta teoria, porque, ao escrever ou falar sobre ela, escrevemos ou falamos sobre nós próprios, e nunca sobre uma coisa ou sobre uma relação que ocorre no mundo para além de nós, nem sobre estudos de casos com os quais nós próprios nada mais temos a ver. E não só: tudo o que se fala e discute sobre o ser-género é per se político. Pois este é o objecto da política para Marx e nisto ele segue Aristóteles12: o ser-género é um ser que se preocupa com o género, que determina, em troca e em debate com o seu género, como quer viver e em que concepção do bem queremos basear as nossas acções. É um zoon politikon.13

Para Marx, não é apenas o questionamento e discussão 'teóricos', uma relação teórica com o mundo que pertence ao ser-género, mas também uma relação prática. Para ele, esta relação prática reside numa actividade de género livre e universal, objectiva.

Antes de mais, com este conceito de actividade de género, Marx não nos apresenta uma lista de actividades ou capacidades com conteúdo específico: Ele não diz que o ser humano é um ser que pode pensar, dançar, caminhar ou falar. Em vez disso, ele caracteriza a maneira como estamos activos ou poderíamos estar activos se ultrapassássemos as condições do trabalho assalariado. A concepção que ele tem em mente não surge "do nada"; a sua realização não seria para ele uma ruptura radical com a história, mas a absorção dos potenciais de desenvolvimento que nela amadureceram e o desenvolvimento dos mesmos. O ser-género não é uma origem perdida à qual seria necessário regressar, mas formula um futuro possível. Marx esboça este futuro possível no contexto das condições e possibilidades históricas, das relações de produção que tem à frente dos olhos.

Com recurso a Aristóteles, Hegel e Feuerbach, podem ser delineados três níveis de significado desta actividade de género – Marx também lhe chama a actividade de objectivação14: Por objectivação, Marx compreende A. a produção de um mundo objectivo e mais precisamente: uma forma de produção que presta atenção à "medida inerente" aos seus objectos; B. a formação de capacidades individuais que nele tem lugar, nunca chegando a uma conclusão positiva, e o poder de acção por ela tornado possível, cujo sucesso depende de uma estrutura social de reconhecimento mútuo; C. a dimensão sensível da experiência e apropriação dos objectos.

Esta concepção de actividade parece basear-se numa certa concepção das possibilidades humanas, mas ao mesmo tempo não parece marcar um estado original e natural de humanidade ao qual seria necessário regressar, nem parece consistir em nada "estático" no sentido de um núcleo essencial (humano ou pessoal) a ser expresso. Em vez disso, a objectivação é descrita como uma actividade ou modo de vida que tem lugar dentro de várias relações interligadas (com o objecto, com os outros, consigo próprio). Dentro destas relações, não se trata principalmente de uma questão de ego que se supõe ser capaz de expressar as suas características individuais de uma forma "prometeicamente expressivista"15 e vê-las retrospectivamente, mas sim de atenção e desenvolvimento de todas as relações envolvidas: para a formação e desenvolvimento de um sujeito livre, considera-se pressuposto que é (estruturalmente) possível fazer justiça com a sua actividade tanto aos objectos (do trabalho e da natureza) como aos seus semelhantes.

A acusação de que a teoria da alienação seria uma filosofia da intimidade, um anseio patético pelas origens e por "estar consigo mesmo", só pode ser expressa por aqueles que não leram Hegel nem Marx cuidadosamente, porque, como Adorno sublinha, "o sujeito não vem a si mesmo através do cultivo narcisista do seu ser por si mesmo, mas através da externalização, através da dedicação ao que não é si mesmo".16

 

V.

A minha intenção de dar à dimensão subjectiva das experiências de alienação um estatuto secundário tem uma razão histórica, para além da pretensão sistemática de estabelecer um padrão geral de crítica baseado na teoria social.

O capitalismo pós-liberal de cunho monopolista surgido na Alemanha após a Segunda Guerra Mundial tinha uma aparência completamente diferente do capitalismo liberal concorrencial que Marx e Engels tinham à sua frente.17 Não só a previsão de empobrecimento feita por Marx no seu trabalho inicial não se tinha tornado realidade, mas sobretudo a alienação tinha perdido completamente a sua "forma economicamente significativa"18 de pobreza. O chamado Estado social já não assumia perante a sociedade o papel de uma superestrutura longe da realidade – como Marx ainda o tinha descrito no seu ensaio Sobre a questão judaica (1844) – mas intervinha em áreas anteriormente intocadas da sociedade (política de educação, política social, política eclesiástica etc.) trazendo aqui progresso social.19 Enquanto Marx tinha entendido o Estado como "servo do poder do dinheiro"20 e "parteiro da ordem capitalista",21 que legitimou legalmente e ocultou ideologicamente o sistema de relações de exploração privadas, esta função tornou-se mais ambígua no capitalismo tardio alemão: parecia que o Estado, tornado cada vez mais democrático através da expansão do direito de voto e das oportunidades de participação, podia finalmente pôr fim às actividades do capital. Os sindicatos corporativos e os partidos populares social-democratas desempenharam um papel no panorama partidário, conseguiram aumentar os salários mínimos, estabelecer contratos colectivos, expandir o sistema de pensões e de segurança social, investir em infra-estruturas e na educação e tributar progressivamente.

Embora um planeamento racional da produção para a sociedade no seu conjunto tenha permanecido ausente, o modo de produção predominante – o fordismo – alimentou, no entanto, as esperanças da sua ocorrência.22 Tornou assim possível a produção em massa de bens de consumo e a satisfação das necessidades básicas da sociedade da maioria. A actividade normalizada e monótona dos trabalhadores e trabalhadoras industriais estava sujeita a condições rigorosas e exigia uma disciplina pronunciada – no contexto do movimento de 68, esta organização do trabalho devia tornar-se objecto de crítica e deviam ser exigidas mais liberdade pessoal e oportunidades de desenvolvimento23 – em troca, no entanto, esta formação de trabalho garantia segurança ao longo da vida e relativa prosperidade. A relação com o trabalho – de acordo com a ideia de Ford – deveria ser meramente instrumental, longe da auto-realização e das reivindicações de individualidade, e "a iniciativa, variedade de tarefas e responsabilidade do trabalhador da fábrica fordista deveria ser reduzida ao mínimo"24; ao mesmo tempo, porém, deveria ser alcançado um elevado nível de aceitação individual dos métodos de produção. O trabalho assalariado permaneceu assim heterodeterminado e também foi sujeito a uma unilateralidade crescente. Assim, a subordinação e a humilhação permaneceram presentes na consciência quotidiana; ao mesmo tempo, porém, perderam a sua brutalidade; o "afundamento na monotonia quotidiana, o desenvolvimento de hábitos de adaptação à própria função, contribuem para uma espécie de tranquilização e alívio da consciência da própria exploração e opressão, que está certamente presente".25 Acima de tudo, porém, o fordismo conseguiu mudar a ideia de si próprios dos e das trabalhadoras através de incentivos externos – bens de consumo, segurança social, pleno emprego etc.: E comparação com a indiferença para com o trabalho e com o quotidiano matar do tempo na fábrica, o lazer e a vida familiar ganharam importância. Deste modo, o trabalho já não surgia apenas como um jugo entendido como injustiça universal, mas ao mesmo tempo como uma condição de possibilidade para certas liberdades. As e os trabalhadores, que se tinham sentido excluídos, alienados e isolados da riqueza da sociedade,26 passaram então para o seu centro.

O facto de a sociedade ser cada vez mais percebida e vivida como uma sociedade sem classes criada pelo Estado social torna necessário para Adorno e os outros teóricos críticos uma análise e reinterpretação da teoria da crise e da teoria do Estado de Marx. Torna-se pouco claro por que se está a lutar a favor ou contra a partir de uma perspectiva de esquerda e social-democrata: Será que ainda se trata de abolir um sistema de trabalho heterónomo, para já não ser nem ter de ser trabalhador/a? Ou trata-se antes de querer ser um/a trabalhador/a bem pago/a? Para Adorno, as conquistas do movimento operário das décadas do pós-guerra, que se traduziram numa representação política dos interesses dos trabalhadores, ocupam um lugar secundário em relação à compatibilidade implícita destas exigências com o sistema: na sua opinião, as lutas sucumbem com demasiada facilidade a uma questionável ética de trabalho27, bem como aos ideais de pleno emprego28 , crescimento29 , progresso30 e um estilo de vida orientado para os recursos.31 As exigências funcionais da reprodução do sistema tornam-se ideais do próprio modo de vida. O problema não está em que os interesses dos trabalhadores estejam representados politicamente – mas sim no conteúdo e orientação desses interesses em si.

Adorno procura explicações nas teorias da cultura e do sujeito para este processo de assimilação, e concentra-se nas formas quotidianas de pensamento e acção que contribuem para ocultar as contradições sociais. A falta de análise económica, de que "os burgueses educados" são frequentemente acusados pelos marxistas, tem a sua razão objectiva: a razão das derrotas e da estagnação dos movimentos revolucionários não reside em quaisquer leis estruturais objectivas ou determinantes económicos, que são depois regurgitados como dogmas marxistas, mas na consciência dos sujeitos, na sua práxis e na ideia de si aí contida. Do ponto de vista da teoria crítica, o capitalismo já não é uma ordem económica orientada unicamente para a maximização do lucro. Cresceu para uma ordem social completa e entrou na forma de pensar e de viver das pessoas; o princípio da rentabilidade estende-se à arte e cultura, ao tempo livre, à elaboração da teoria nas universidades, mas acima de tudo às relações interpessoais e privadas.

É o lado subjectivo, a experiência e a consciência de que algo não bate certo com as condições em que vivemos que é cada vez mais recalcado no processo de integração em favor da identificação:

A adaptação das pessoas às condições e processos sociais, que constitui a história e sem a qual se teria tornado difícil para as pessoas continuar a existir, sedimentou-se nelas de tal modo que está a encolher a possibilidade de a abandonar, mesmo em consciência, sem insuportáveis conflitos de desejo. Elas são, triunfo da integração, identificadas com o que lhes está a acontecer, até aos seus padrões de comportamento mais íntimos.32

Teóricas e teóricos do círculo de Adorno também partilharam estas observações: Por exemplo, no seu ensaio de 1963 Zwischen Philosophie und Wissenschaft: Marxismus als Kritik (Entre Filosofia e Ciência: O Marxismo como Crítica), Habermas descreveu o perigo de se caminhar para uma sociedade que poderia começar a sentir-se confortável na alienação: Uma democracia de massas controlada pelo Estado social acabaria por se instalar completamente no "bem-estar de uma alienação higienicamente aperfeiçoada, cujo aguilhão seria total e permanentemente deslocado da consciência "33. Os vestígios de alienação já não se encontrariam na miséria dos trabalhadores alienados, mas sim no tempo livre, na indústria do entretenimento e em todo o domínio da produção das necessidades. As formas de alienação, de acordo com Habermas, seriam "sublimadas" e já não "específicas da classe"; tornam-se "mais refinadas" e "mais secretas".34

Marcuse também tem em conta este desenvolvimento em O homem unidimensional (1967):

Acabo de salientar que o conceito de alienação parece tornar-se questionável quando os indivíduos se identificam com a existência que lhes é imposta e têm nela o seu próprio desenvolvimento e satisfação. Esta identificação não é uma aparência, mas sim a realidade. A realidade, no entanto, constitui uma fase mais avançada de alienação. Esta tornou-se inteiramente objectiva; o sujeito, que está alienado, é incorporado na sua existência alienada.35

Adorno teve em mente desde os seus primeiros escritos o desaparecimento da consciência e da experiência da alienação, a sua inconsciência ou mesmo a sua internalização, tornando este estado de coisas cada vez mais explícito nas Minima Moralia. Ele esboça um cenário de crescente concordância entre pessoa e função, entre o suposto lar e o trabalho, que para o proletariado de Marx ainda divergia de forma palpável entre o próprio e o alheio. Ele visa assim uma problemática histórica que se poderia chamar processo de integração da alienação, ou des-alienação:

A pessoa torna-se novamente na consciência aquilo que já é no ser. Perante a ilusão da personalidade existente em si e independente no meio da sociedade das mercadorias, tal consciência é a verdade. [...] Quanto menos sentido funcional tem a divisão social do trabalho, mais teimosamente os sujeitos se agarram ao que a fatalidade social lhes destinou.36

Se é verdade que face aos processos de integração do século XX "o conceito de alienação parece tornar-se questionável" (Marcuse), isto não só torna ainda mais importante insistir na persistência dos seus fundamentos económicos, como também altera a fenomenologia da alienação: Já não deveríamos preocupar-nos principalmente com os fenómenos de alienação que aparecem na máscara da alienação, mas sim com os que aparecem na máscara da familiaridade. Se concordarmos com os teóricos e teóricas críticos sobre a tese de que o capitalismo pode desenvolver enormes forças socialmente integradoras, pacificar superficialmente os antagonismos e até assumir e fazer uso de críticas feitas contra ele, então é necessário, pelo menos segundo esta tentativa, transferir as teses desta integração – desenvolvidas durante a era do Estado social fordista – também para as teorias da alienação. Por vezes tem de surpreender que se tenha falado da integração do proletariado ou das ideologias como falsas formas de consciência já desde há mais de 50 anos, enquanto a integração da alienação ou formas invertidas ou veladas de alienação que passaram para a consciência quotidiana e para o hábito quase não foram estudadas (nesta conceptualização). Tal investigação, no entanto, está disponível: São as Minima Moralia de Adorno.

Nesta colecção de aforismos a partir da "vida danificada", ele mergulha nas ramificações e voltas dos domínios que são normalmente considerados como opostos ao trabalho – vida privada, tempo livre, consumo, sexualidade etc. – ele não aponta "exemplos" de alienação, não diagnostica "patologias" nem esboça uma contrateoria positiva da vida boa. Em vez disso, o tema é "aquilo a que estamos habituados, de tal modo que já não nos admira, a nossa vida quotidiana, algum costume a que estamos presos, toda e qualquer coisa com que sabemos [de vez] estar em casa”.37 Em suma, Adorno investiga as "formas alienadas" da existência individual precisamente onde menos se suspeita delas.

Adorno descreve como o indivíduo ideologicamente se instala no mundo alienado do trabalho como sua casa; a "pena e a praga"38 do trabalho tende a dar lugar à identificação com ele. A alienação, segundo Adorno, transformou-se em absoluta proximidade, ausência de distanciamento, familiaridade, sendo mantida nesta forma disfarçada.39 Na minha opinião, as teses e o método de Adorno são confirmados pela actual adopção de novas técnicas de gestão, pela transformação neoliberal do trabalho em jogo e em suposto terreno da auto-realização, individualidade e autonomia.

 

VI.

O facto de não haver vida verdadeira na vida falsa não significa que toda a nossa convivência seja repentina e completamente desvalorizada, que não haja felicidade, nem alegria, nem beleza. Só que – estas categorias não têm qualquer relevância para o diagnóstico da alienação e certamente não são elas que o refutam.

Às autoras e autores que objectam que o pressuposto da alienação total tem como consequência que não se pode saber nada sobre a própria alienação, uma vez que isso requer a experiência do contrário, há que responder o seguinte: a totalidade entendida dialecticamente não significa um todo sistemicamente fechado, um recipiente no qual simplesmente se atira tudo para depois o declarar mau.

Adorno e Marx tomam o conceito de Hegel. Conceito que se refere a um entrelaçado de contextos de medição, que percorre o todo (Lat. totum) e é comparável ao conceito de infinidade (lógica) de Hegel. Tal como é verdade para a "verdadeira infinidade" que também tem de conter a finitude, pode dizer-se: se a totalidade não incluísse também a excepção e o oposto de si mesma, não seria total. Só que as excepções continuam a ser negativamente determinadas por aquilo de que elas próprias se excluem. (Toda a Dialéctica Negativa se dedica à consciência destas excepções). A maioria das concepções contemporâneas de alienação, no entanto, tende a dar a volta aos sinais e a afirmar: Vivemos no verdadeiro, embora ainda haja todo o tipo de falso neste verdadeiro.

Por muito importante que seja a evidenciação de sintomas como o burnout, ou mesmo a crítica de condições de trabalho precárias, por um lado, a maioria das vezes não são tidas em consideração as mudanças históricas na fenomenologia da alienação – não se distingue fundamentalmente entre as formas clássicas e as novas formas integradas, ou pelo menos não se oferece uma explicação para as suas diferenças – e, por outro lado, defende-se com demasiada ligeireza o "normal" como regra e padrão, apontando-se as disfunções e os desvios como exemplos de alienação. No entanto, quando casos individuais são citados e apresentados como exemplos de alienação – trabalhadores e trabalhadoras subcontratados que sofrem com medidas de reestruturação, um paciente num grande hospital modernizado para quem ninguém consegue arranjar tempo,40 um recém-leitor não autêntico, uma feminista risonha, uma professora indiferente,41 o Gustav orientado para os recursos, a Anna mal-humorada42 etc. – isso sugere que todos os outros casos, que normalmente não são especificamente ilustrados devido à sua suposta evidência, são os casos não alienados de uma vida bem sucedida. Aqui é aparentemente possível – dependendo da abordagem teórica – gerir relações ressonantes (Rosa) ou apropriar-se das próprias condições de vida (Jaeggi).

Portanto ela existe – esta vida verdadeira na falsa. Ergo, o falso não pode ser tão falso.

(… e penso que devemos opor-nos a isso. Muito obrigada).

 

 

1 Beckett, Samuel: Fim de Partida, Cosac Naify Edições, São Paulo, 2002, p. 81.

2 Jaeggi, p. 11.

3 "A única linguagem inteligível que falamos uns com os outros são os nossos objectos na sua relação entre si. Não compreenderíamos uma linguagem humana, e ela permaneceria sem efeito; seria conhecida e sentida, por um lado, como um pedido, como um apelo, e portanto como uma humilhação, e por isso seria apresentada com vergonha, com o sentimento do rebaixamento, e, por outro lado, seria recebida e rejeitada como impudicícia ou loucura. Estamos tão alienados mutuamente do ser humano que a linguagem imediata deste ser nos aparece como uma violação da dignidade humana, enquanto a linguagem alienada dos valores objectivos nos aparece como a linguagem justificada, autoconfiante e em si reconhecendo a dignidade humana". (MEW 40, p. 461).

4 "Um dos termos gerais pelos quais os gregos e romanos designavam os estrangeiros, a palavra barbaros, remonta ao fenómeno das diferentes línguas. Na Ilíada de Homero, os Carianos são chamados barbarofonoi, uma designação que evidentemente exprime por onomatopeia o som estranho de uma língua não inteligível para os gregos; o grito grasnante das aves também pode ser caracterizado como barbaros. (Dinzelbacher, Peter(ed.): Europäische Mentalitätsgeschichte. Stuttgart: Kröner 2009, pp. 459-519, aqui: p. 460.)

5 Müller-Funk conclui: "A figura do estranho resiste a qualquer substanciação. Cada um de nós pode tornar-se um estranho numa determinada situação, relação ou constelação". (Theorien des Fremden. Eine Einführung, p.16.)

6 O estatuto dos fenómenos de alienação exige uma mudança de perspectiva: uma reorientação da elaboração da teoria, que caracterizo no meu trabalho como viragem fenomenológica.

7 MEW 2, p. 37, e. p.

8 "A alienação das pessoas vivas pelos poderes sociais objectivados só poderia ser penetrada por uma teoria que deriva essa alienação das próprias relações sociais". AGS20.2, p. 676.

Ou: "A desgraça reside nas relações, [...]; não principalmente nas pessoas nem na forma como as relações lhes aparecem". AGS 6, p. 191.

9 A diferença entre um processo (Jaeggi) e uma relação é que o primeiro (conceptualmente) prescinde de relações e, logicamente falando, apenas descreve a progressão contínua de "algo" ou de "alguém". Os conceitos de "alienação" e "apropriação", no entanto, não podem ser compreendidos sem assumir uma pessoa que se aliene ou se aproprie de algo, e mesmo quando estes actos são definidos como processos puros, como faz Jaeggi, continua a ser pressuposta uma pessoa que passa por estes processos. Esta pessoa, contudo, não é (!) um processo.

10 Jaeggi, p.52.

11 Os animais também têm uma vida de género, mas compreender-se a si próprio como género, para poder tornar-se um género "para si próprio" – aqui concordam Hegel, Feuerbach, Marx – apenas o ser humano, por exemplo HW 3, p. 143; cf. também: Feuerbach, Das Wesen des Christentums [A essência do cristianismo], p. 37.

12 Política I 2. 1252a7-19: "Isto, porém, é peculiar aos seres humanos em comparação com outros seres vivos, pois só eles possuem a percepção do bom e do mau, do justo e do injusto etc. Mas a comunidade nestas coisas cria o lar e a polis".

13 E é por isso que Marx também pode dizer que o capitalismo é na realidade apolítico – porque o capitalismo, enquanto capital e trabalho, fixa a estrutura da nossa actividade e do nosso modo de vida, assim bloqueando o debate aberto e o questionamento que tornariam a política possível.

14 Será que aqui Marx não negligenciará também pensar sobre a importância de formas de actividade não objectivas e não produtivas, tais como as chamadas actividades reprodutivas ou de cuidados? Temos de estar de acordo com as feministas, que têm vindo a fazer estas críticas há décadas. Marx não lida especificamente com estas actividades. Mas alguns aspectos gerais da actividade, que Marx normalmente apenas insinua, podem ser recolhidos e agrupados, o que eu acredito que também pode ser aplicado com ganho às formas de actividade reprodutiva. Estas incluem o reconhecimento e a promoção da dimensão corporal e sensível do nosso ser no mundo, o conceito de reconhecimento mútuo e sem dominação, bem como a possibilidade de compromisso voluntário, devoção e cuidado com as nossas condições sociais e naturais de existência.

15 Assim, a interpretação de Charles Taylor: Taylor, Charles: Hegel. Frankfurt am Main: 1993, p.733.

16 AGS 10.2, pp.639-644, aqui: p. 643.

17 A preocupação aqui obviamente não pode ser a de oferecer um relato pormenorizado e abrangente em termos político-sociais, político-económicos ou mesmo de sociologia do trabalho. Isto não pode ser encontrado no trabalho de Adorno – e por isso aqui me refiro a outros autores: Habermas, Offe, Lessenich – nem parece ser necessário para o meu projecto. Em vez disso, trata-se de tendências históricas que quero ilustrar de forma aproximada, a fim de ancorar empiricamente a tese da dialéctica da alienação a ser desenvolvida aqui. A transformação histórica dos fenómenos de alienação na década de 1930, na altura da fundação da Teoria Crítica original, tendo como pano de fundo o movimento operário falhado, o estabelecimento do socialismo de Estado soviético e os desenvolvimentos fascistas em alguns países europeus mereceria um estudo à parte. Seria igualmente interessante incluir nas considerações a relação entre a Alemanha Ocidental e Oriental ou a constelação internacional dos anos do pós-guerra. A leitura de Adorno não oferece nenhuma ajuda para remediar essas deficiências: Em vez disso, fala muitas vezes muito monoliticamente de "uma" sociedade, que na realidade deveria ser concretizada histórica e internacionalmente, ou – como no capítulo da indústria cultural da Dialéctica do Iluminismo – confunde a cultura de massas americana, o Behemoth de Neumann, as teses de Pollock sobre o capitalismo de Estado e o Estado social alemão de um modo que os torna difíceis de desembaraçar e diferenciar.

18 Habermas 1988 [1963], p.228.

19 Habermas: Strukturwandel [Mudança estrutural], p. 177s.

20 MEW 1, p.374. Cf. também Engels in Anti-Dühring, MEW 20, p. 260.

21 MEW 23, p. 779.

22 Cf. Gramsci, Antonio: Amerikanismus und Fordismus, in: ders, Philosophie der Praxis, ed. e traduzido por Christian Riechers, Frankfurt a.M. 1967, pp. 376-404.

23 Boltanski, p. 217.

24 Gabler, Andrea: : Die Despotie der Fabrik und der Vor-Schein der Freiheit. Von »Socialisme ou Barbarie« gesammelte Zeugnisse aus dem fordistischen Arbeitsalltag http://www.workerscontrol.net/de/authors/die-despotie-der-fabrik-und-der-vor-schein-der-freiheit [O Despotismo da Fábrica e a Pretensão da Liberdade. Testemunhos do trabalho quotidiano fordista recolhidos por "Socialisme ou Barbarie"]. In: Archiv für die Geschichte des Widerstandes und der Arbeit 16, pp.349-378, aqui: p.363. (Trata-se de relatos de trabalho fordista quotidiano recolhidos por Cornelius Castoriadis e Claude Lefort nas suas pesquisas laborais de 1949, Socialisme ou Barbarie).

25 Ibid, p.356.

26 AVL 15, P.12.

27 AGS 8, P.363.

28 AGS 8, P.363.

29 DDA

30 Adorno, Stichworte. Kritische Modelle 2, p. 41 e.p.

31 AGS 4, Kind mit dem Bade [Criança com a Água do Banho].

32 AGS 8.

33 Habermas 1988 [1963], p. 230.

34 E Ernst Bloch: "O alheio aqui é prefigurado no antigo significado da palavra; significava miséria, também loucura. Hoje, tal coisa é experimentada de novo: não como um exterior distante, mas precisamente como um em casa, no mundo da nossa vida externalizada, mercantilizada, reificada". Bloch, Entfremdung, Verfremdung, p. 83.

35 Marcuse 1967 [1964], p. 31. Cf. também: "Uma vez mais estamos perante um dos aspectos mais perturbadores da civilização industrial avançada: o carácter racional da sua irracionalidade. A sua produtividade e eficiência, a sua capacidade de aumentar e difundir a conveniência, de transformar o desperdício em necessidade e a destruição em construção, a medida em que esta civilização transforma o mundo dos objectos numa extensão da mente e do corpo, torna até questionável o conceito de alienação. As pessoas reconhecem-se nas suas mercadorias; encontram a sua alma no seu carro, no seu receptor de alta-fidelidade, no seu aparelho de cozinha". (Ibid., p.29.)

36 AGS4, P.288.

37 Nietzsche, FW, KSA3, p.594.

38 Sobre a mudança de significado do trabalho, ver também Arendt 1960, p.48; Plessner 1960, p.217.

39 AGS 3, p.184, 320; AGS 4, p. 45, 114, 167, 234, 288; AGS 8, p.118; AGS 14, p.23, 29; AGS 20.2, p. 491; já em Marx: cf. MEW 25, p. 838.

40 Zima, p. 8.

41 Jaeggi 2005, p.?..

42 Rosa 2016, p.15, 23.

 

 

Original “Einige Bemerkungen zur Dialektik der Entfremdung bei Marx und Adorno – Vortragsmanuskript zum exit-Seminar 2022” in: www.exit-online.org, 09.11.2022. Texto da comunicação apresentada no seminário da exit! 09.2022. Tradução de Boaventura Antunes

 

 

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