Richard Aabromeit
QUE ESCOLHA RESTA À GRÉCIA DEPOIS DAS ELEIÇÕES?
Πἁντα ῥεῖ – apenas na Grécia não?
As posições
"... Foi simplesmente como se ninguém tivesse dito nada". Na tradução alemã de uma conversa de Yanis Varoufakis com o New Statesman, reproduzida no Neues Deutschland de 16 de Julho de 2015, o antigo Ministro das Finanças grego exprime o seu espanto com o facto de os/as seus/suas colegas do Eurogrupo, nas negociações sobre a dívida soberana da Grécia e um possível terceiro pacote de resgate para a Grécia, não terem querido ter nenhuma discussão com ele sobre o assunto ou sobre questões económicas e terem ignorado simplesmente as suas observações no resultado final. Todos os seus argumentos e análises foram de certo modo recebidos pela competência e poder reunidos da política financeira europeia, sobretudo pelo Dr. Wolfgang Schäuble, mas mesmo assim efectivamente ignorados. Isso indica quão isolado estava o governo grego do ΣΥΡΙΖΑ (1) e Varoufakis pessoalmente desde o início destas negociações com os outros 18 membros do chamado Eurogrupo (2), com a Comissão Europeia e com o FMI. Este Eurogrupo é uma construção única que, segundo a avaliação de um parecer do parlamento alemão, "fundamentalmente não tem poder para uma decisão independente". Isto deve ser visto em ligação com a discussão actualmente em curso nos média e entre o público em geral sobre o tema da Grécia e da sua dívida pública, em geral, e sobre as condições para o terceiro pacote de ajuda recentemente aprovado, em especial.
Embora o SYRIZA se tenha imposto claramente de novo nas eleições de 20 de Setembro, nada de decisivo vai mudar, a não ser Alexis Zipras a revelar-se definitivamente como o Gerard Schröder grego, continuando a aplicar-se que a situação na zona euro, sobre o tema da Grécia e também em geral, é antes de mais marcada essencialmente por duas posições à primeira vista fundamentalmente diferentes: de um lado estão os que, partindo de ideias neoliberais ou economicamente conservadoras, consideram a política de austeridade adequada e promissora. As suas posições e exigências prevaleceram até agora no essencial, como era esperado: a privatização das empresas públicas (e lucrativas) tais como portos e aeroportos deve ser promovida; o orçamento de Estado deve apresentar a médio prazo um excedente primário (3) de 3,5%, o que só pode ser alcançado através de cortes, especialmente na área social; a reformulação do sistema de pensões deve garantir que a idade de reforma é aumentada para 67 anos e que a reforma antecipada será significativamente penalizada; o IVA será aumentado de 13% para 23%; as regras para a contratação colectiva dos salários serão revistas.
Do outro lado estão aqueles que rejeitam estas medidas de austeridade penalizadoras da maioria da população e favoráveis às instituições de crédito da Grécia. Aqui pertencem em primeira linha todos aqueles que em sentido amplo se enquadram nas posições do jornal TAZ, isto é, pessoas e grupos que insistem em defender posições solidárias, críticas do crescimento e difusamente anti-capitalistas. Como exemplo podem ser aqui apresentados comentários publicados pelo TAZ no seu site (taz.de) em 06.09.2015: "Ao mesmo tempo, a crise também obriga a encontrar novas formas de viver e trabalhar juntos e aumenta os espaços onde são testadas. Projectos que há anos vêm sendo promovidos por grupos anarquistas, anti-fascistas e de solidariedade ganham agora grande adesão, surgem novas ideias. Há espaços de auto-gestão e projectos de vizinhança, clínicas de solidariedade, ilhas sem economia monetária, lojas gratuitas, economia de troca, cooperativas, oficinas e projectos de auto-ajuda. Modelos de base democrática com decisões consensuais e trabalho colectivo tornam-se mais conhecidos e familiares. Alguns gregos são, portanto, obrigados a juntar-se para construir uma sociedade solidária e pacífica a partir de baixo.” Os neo-keynesianos, cujo pensar é puramente do espectro político convencional, também lhe pertenceriam; como, porém, do seu lado, para além da exigência de um extenso mas não especificado programa de investimentos, bem como do aumento da despesa pública, pouco houve que se ouvisse, principalmente na área social, por isso mesmo vou deixá-los subsumidos indiferenciadamente na posição de economia solidária do TAZ.
Uma terceira posição que surge mais marginal, arqueomarxista de cima a baixo, pode ler-se na Junge Welt de 18/19 de Julho de 2015: "Uma vez que tanto os interesses das classes dominantes como os das classes dominadas são contraditórios e a luta de classes pode desenvolver-se sempre em direcções diferentes, de modo nenhum estava claro desde o início como terminaria o processo de negociação entre o governo grego e os credores."
Outra argumentação mais periférica, construída com base na pura política de poder, afirma que a postura intransigente e de linha-dura da Troika e, em particular, do Ministro das Finanças alemão só tinha dois objectivos: em primeiro lugar, a rejeição clara do primeiro governo de esquerda radical da UE, e, em segundo lugar, a prevenção de um precedente. No entanto, podem-se reconhecer fragmentos desta última posição mais ou menos atenuados em quase em todas as posições.
Em resumo e ligeiramente simplificado, portanto, em primeira linha estão os defensores de uma férrea política de austeridade, grandes privatizações e ajustamentos estruturais drásticos, contra aqueles que defendem um aumento da despesa pública, um amplo perdão da dívida e o início de um programa de investimentos, bem como a exploração de oportunidades de métodos alternativos de gestão para medidas mais eficientes. Nem os/as marxistas da luta de classes nem quaisquer outros/as apresentaram propostas – sequer – que tivessem de ser discutidas a sério. A última das posições acima, ou seja, a da política de poder, quase parecendo de teoria da conspiração, está difundida em doses mais ou menos fortes um pouco por todos os outros pontos de vista e além disso é dificilmente perceptível, de modo que gostaria de me concentrar aqui nas duas primeiras. Uma vez que nenhum dos peritos que aparecem na esfera pública insistiu afinal no tema "Grexit", também não vou focar este tema; de facto ele acaba por ser de importância secundária, o que também se deduz da minha argumentação.
O que estas posições esquecem
As semelhanças entre os pontos de vista acima brevemente delineados muito provavelmente não são reconhecidas pelos respectivos representantes, sendo que as discussões sobre as medidas a tomar e sobre as razões para as desgraças gregas são por vezes tão violentas que fica a impressão de diferenças irreconciliáveis. Essas semelhanças podem ser resumidas dizendo que em toda a parte se toma uma situação actual por puramente estática (ver abaixo) e se a considera má, mas as razões para isso, incluindo a história cronológica da formação desta miséria, são ignoradas por uma questão de simplicidade. Também a negação ou recalcamento dos principais conjuntos de problemas com que a Grécia se confrontou cada vez mais desde a sua entrada no Eurogrupo, ou seja, o seu forte atraso na produtividade do capital e do trabalho de acordo com os critérios da economia política – para não falar de critérios marxistas – aglutina involuntariamente a grande maioria dos comentários e exigências. Assim, as diferentes propostas para melhorar a situação da Grécia não se baseiam na percepção dos problemas reais, nem mesmo na consideração de todos os dados empíricos relevantes, mas unicamente no ponto de vista político de cada um dos participantes na discussão.
Repetidamente se pode ver em quase todos os comentários, relatórios e debates sobre o tema da Grécia uma incrível falta de reconhecimento dos factos – real ou simulada –, a adesão aos velhos preconceitos e a criação de novos, e muitas vezes também uma simples projecção de situações experimentadas cá na terra sobre a situação na Grécia. Acrescem ainda nalguns casos ressentimentos patéticos e muita demagogia de conversa de café. A pergunta seria: será isto um processo de recalcamento e de negação, sendo isso realmente incrível, e será isso uma conduta dos média com a qual temos de nos acostumar a partir de agora – se é que não o fizemos já há muito tempo? Talvez os/as representantes dos média não possam ou não queiram "relatar" de modo diferente, porque se não eles teriam de descrever e explicar uma situação muito complicada nos seus jornais, blogs e emissões, o que iria possivelmente aborrecer ou exigir demais aos/às consumidores/as destes meios e poderia assim arruinar a edição, o número de cliques ou a audiência. Pois é bastante mais simples, mais promissor e não em último lugar mais rentável denunciar generalizadamente e corroborar com um par de episódios a alegada preguiça e/ou a suposta manha de todo um povo, ou, em alternativa, flagelar a suposta falta de firmeza do ex-Primeiro-Ministro Alexis Tsipras.
Mas, independentemente de se preferir a política de austeridade repressiva completamente falhada ou a política do postulado neo-keynesiano completamente desesperado junta com umas ideias ilusórias de economia solidária, de ambos os lados alguns factos realmente complicados, mas bastante óbvios, não são abordados ou pelo menos não são abordados suficientemente. Como brincadeira mais recente, é de notar que de algum modo todas as partes existentes no espectro da esquerda favorecem secretamente uma espécie de Grexit (4) de esquerda – à semelhança do que também Schäuble faz – ou pelo menos têm-no em consideração, como recentemente Tom Strohschneider no Neues Deutschland de 14.08.2015: "Grexit de esquerda?"
A situação
Mesmo a comparação de princípio não expressa e muitas vezes negligente, seja consciente ou inconscientemente, da economia grega com as de nações industriais tradicionais, como a Alemanha, o Reino Unido, a Holanda, ou a França, e mesmo com a dos EUA e do Japão, mostra claramente que qualquer abordagem diferenciada continua a não ser tida em conta e fora de todas as ideias nos dois pontos de vista principais dos especialistas sobre a Grécia. A partir desta comparação implícita, tira-se em geral a conclusão de que a Grécia de hoje não deveria nem poderia ser, simplesmente e sem penalização, libertada da sua situação complicada. Se a Grécia apresentou uma dívida tão grande, então "os gregos", se fazem favor, também não devem evitar as consequências e, finalmente, devem tomar a sério a poupança, a auto-regulação, o reembolso etc.
Uma vista de olhos aos números da econometria já nos revela algumas diferenças em relação aos centros capitalistas dos países plenamente industrializados: o sector terciário grego, ou seja, o sector de serviços, representa actualmente cerca de 71% do PIB, só o sector do turismo contribui com 16%, sem comparação com qualquer outro país da UE em termos de percentagem do PIB. O sector secundário, isto é, a indústria, contribui na Grécia com cerca de 16%, o primário (extractivo), ou seja, em especial agricultura e pescas, ainda assim com cerca de 6%, mais uma vez sem comparação com qualquer outro país da UE. Isto significa: a agricultura e o turismo constituem quase um quarto do PIB; agora se tivermos em conta uma parte do sector secundário, ou seja, a transformação industrial de produtos agrícolas produzidos no país, então aproximamo-nos de um terço do PIB que não tem nada a ver com a indústria clássica; mas é apenas aqui que ocorrem os ganhos de produtividade relevantes e por isso ainda se criam – embora numa escala menor que nunca – novos postos de trabalho. Para já não falar do atraso da economia grega no tema da produtividade industrial no seu conjunto; o nível desta produtividade é uma categoria global e exige a todos os que desejam participar no mercado mundial ou no mercado europeu que atinjam pelo menos este nível. É justamente aqui que a Grécia tem o seu problema central. É verdade que os dados da econometria burguesa dão somente informações limitadas e, principalmente, apenas indirectas sobre a realidade económica; mas, como primeira evidência empírica, eles servem com certeza: Enquanto os/as gregos/as trabalham em média 2.034 horas por ano, em comparação na Alemanha trabalha-se apenas 1.393 horas por ano; no entanto durante este tempo na Grécia produz-se um PIB por hora trabalhada de somente cerca de US $ 36; em comparação, a média na UE é de cerca de US $ 50 e na Alemanha de US $ 62. Assim se refuta o preconceito dos gregos "preguiçosos", mas também se mostra que os problemas estruturais na Grécia estão de facto essencialmente na quase irrecuperável baixa produtividade da economia. É apenas uma ilusão acreditar que esta situação pode mudar para melhor com poupanças e privatizações.
A dívida pública da Grécia ascende actualmente a mais de 310 mil milhões de €, ou seja, cerca de 177% do PIB, que atingiu em 2013 cerca de 182 mil milhões de €. Em comparação, em 2007, ou seja, pouco antes do crash global, o rácio da dívida pública grega era apenas um pouco mais de 100% do PIB, em 1987 apenas cerca de 50%. O aumento acentuado particularmente depois de 2007 é devido ao grande esforço do Estado grego e das instituições (BCE, FMI, Comissão Europeia) para o resgate dos bancos (privados) gregos e não à extravagância ou devassidão desse Estado. Com o resgate dos bancos em 2010, as dívidas antes privadas (dos bancos privados gregos) foram em grande parte nacionalizadas (5) – e agora é exatamente essa censura que é feita ao mesmo Estado. Em comparação, na Alemanha o mesmo rácio da dívida pública em função do PIB ascendeu, também em 2013, a cerca de 78%, nos EUA a cerca de 100%, em Espanha quase 85%, na China ainda apenas cerca de 25%. A taxa de desemprego na Grécia em Março de 2015 foi de 26%, em Espanha quase 25% – em qualquer outro lugar na UE (NB: incluindo Portugal) significativamente menor. Estes dados serão analisados em mais detalhe abaixo.
Quem quer que olhe para estes números com razoável atenção e os interprete com um pouco de conhecimento de causa sabe que a Grécia nunca vai conseguir pagar as dívidas (6) e até mesmo o serviço dos juros é pouco provável que se mantenha sem permanentes reestruturações e diferimentos. Com o terceiro programa de ajuda recentemente adoptado, em que mais medidas de austeridade constituem alegremente a tónica principal, isso também não estará em vias de mudança. Estranhamente, o peso da dívida na Grécia, de facto, foi quase completamente nacionalizado, e os governos de Tsipras tinham começado as primeiras acções no âmbito dos requisitos de austeridade – no entanto: as dívidas praticamente não diminuíram. Ainda assim, os neoliberais dizem teimosamente que apenas é preciso esperar até que se mostrem os efeitos benéficos das suas medidas!
Apesar de ser mínima a probabilidade do pagamento da dívida da Grécia, mais implícita que explicitamente há ou tem de haver como que um consenso entre todos os participantes no debate, dos arruaceiros neoliberais passando pelos covardes neo-keynesianos e pelos sonhadores da economia solidária até aos espertalhões arqueomarxistas, em toda a parte se procedendo como se a Grécia tivesse de, ou seja, os seus/suas contribuintes (seja lá isso o que for concretamente, sendo que o pagamento dos impostos devidos pressupõe supostamente algum tipo de livre vontade) devessem/pudessem/tivessem de efectuar realmente este pagamento alguma vez de algum modo. Só assim se poderá entender mais ou menos por que é que a rigidez de Schäuble e da "Troika" assume tais proporções e neste ponto permanece sem resistência apreciável. E naturalmente: se se (i. e., o resto de Eurolândia) mostrasse tolerância para com a Grécia, em seguida também todos os outros países com problemas viriam rapidamente a correr e também quereriam qualquer alívio ou ajuda (financeira)!
Agora é preciso aqui insistir vigorosamente de novo em que os dados e comentários anteriores (e também os que seguem) assentam exclusivamente nos números burgueses da econometria. Se tivermos em consideração o facto de entre 1986 e Junho de 2010 ter havido na Grécia apenas um instituto de estatística, na dependência do Ministério da Economia e Finanças (ou seja, politicamente influenciável de imediato) e de somente em Julho de 2010 ter sido criado um instituto de estatística independente do governo, haverá certamente dúvidas sobre a validade dos números. (7) Mas o que, apesar de tudo, decorre da situação incerta dos dados é duplo: em primeiro lugar, a Grécia, por causa do peso dos juros e reembolsos, não vai dispor de nenhuma margem de manobra para qualquer desenvolvimento económico no futuro previsível. Em segundo lugar, o atraso da Grécia no que respeita à produtividade industrial em relação aos outros países da UE e da zona euro é demasiado grande para poder ser colmatado a médio ou menos ainda a curto prazo. Por outro lado, e isto em geral não é realmente silenciado, mas é pouco referido, a situação social de uma grande parte da população grega não é apenas de miséria, mas cada ano é ainda mais miserável devido às medidas introduzidas com a crise económica ocorrida em 2008. Por exemplo, o PIB na Grécia caiu em termos reais em mais de um quarto do seu valor entre 2008 e 2013. As consequências da crise económica e financeira e das medidas impostas são devastadoras, como sublinham a título de exemplo alguns números (8):
– De 2011 a 2013 cerca de 70.000 empresas entraram com pedido de insolvência, estando em risco de falência um número estimado de mais de 180.000;
– O rendimento médio caiu cerca de 22% entre 2009 e 2013; juntamente com o aumento dos preços em mais de 10% durante o mesmo período, isso resulta numa perda de poder de compra da maioria da população de quase um terço em quatro anos;
– Quase metade dos pensionistas recebem no máximo 500 € por mês;
– 38% dos gregos e das gregas vivem abaixo do limiar da pobreza;
– Quase dois terços das pessoas com menos de 25 anos estão desempregadas;
– Cerca de 800 mil pessoas (em cerca de 11 milhões, ou seja, sete por cento da população grega, incluindo lactentes e crianças) já não têm acesso ao serviço de saúde.
Se Angela Merkel e Wolfgang Schäuble queriam realmente estabelecer a Grécia como exemplo, custe o que custar (9), então exactamente isso já foi muito bem conseguido até hoje – só que a situação não tem melhorado desde então nem vai melhorar no futuro. Apenas não se agravou (ainda?) dramaticamente porque na Grécia as famílias e clãs (precisamente por causa das suas relações sociais tradicionais, ou seja, do ponto de vista dos centros capitalistas, atrasadas) ainda são capazes não só de livrar da ruína final os necessitados (desempregados, pobres, viúvas, jovens, idosos etc.) e mantê-los no círculo dos socialmente ainda reconhecidos, mas também de considerá-los com toda a naturalidade.
As razões
As razões para a miséria na Grécia são muito referidas por todos os lados; a maioria das vezes servem para justificar que a Grécia tem de se confrontar com a sua situação actual, mas infelizmente estão cheias de calculismo, de preconceitos e de medo. Das duas posições principais sobre a crise da Grécia acima mencionadas, ou seja, a neo-liberal e a neo-keynesiana / da economia solidária, foram de facto lançadas para discussão algumas propostas para remediar esta crise (ver acima); mas, no que respeita às razões para o surgimento da crise, pouco se pode daí aproveitar além de banalidades. Ora quase ninguém quer tomar nota a sério destas razões no quadro da problemática da Grécia. Estas razões, de facto, já podem ser lidas nas estatísticas e relatórios conhecidos; mas só podem ser entendidas (quase heuristicamente) com a ajuda de uma reflexão razoavelmente intensiva e com base em todos os dados, portanto não apenas com base nos aprazíveis dados empíricos. A quem conseguir desencadear este processo de reflexão de forma propositada e consistente não lhe escapará que o desenvolvimento de crise do capitalismo contemporâneo leva a problemas enormes mesmo nos centros do processo de valorização (10); nas extremidades dos centros, por exemplo na Grécia, estes problemas já se mostram de forma claramente agravada; da situação da periferia (11) não vamos falar aqui. Ora esta propensão para a crise consiste em que durante cerca de 50 anos globalmente foram vítimas do aumento da produtividade mais trabalhadores do que os que foram procurados de novo graças à expansão dos mercados, a novos produtos, ou devido à redução dos custos do trabalho. Se isto já nos centros levou a efeitos secundários muito desagradáveis, por exemplo, na Alemanha, a relações de trabalho cada vez mais precárias, em países à partida economicamente muito mais fracos, como Grécia, o mesmo mecanismo de acção só poderia levar a consequências ainda piores. Infelizmente, e isso simplesmente não é notado nem tomado em consideração pela chamada esquerda ou pelos progressistas, as correntes principais acima mencionados (neoliberais e neo-keynesianos / defensores da economia solidária) a este respeito não diferem nada entre si. Mas eles ainda lutam entre si com muita força – eu pergunto-me: com que propósito?
Qual deve ser a direção?
Medidas políticas significativas não podem visar medidas estruturais ou de austeridade pseudo-realistas, uma vez que de qualquer maneira não conseguem fazer nada, excepto aumentar o sofrimento de uma grande parte da população helénica. Pelo contrário, elas teriam de assumir um carácter que aceitasse a afirmação da formação social existente, em que com quaisquer outras medidas a curto ou a médio prazo na Grécia nada pode ser alterado na valorização do capital, ali ou em outro lugar, ou até mesmo globalmente. Portanto, medidas significativas e bem sucedidas devem ser escolhidas exclusivamente com a finalidade de aliviar o sofrimento de cerca de um terço da população grega, e simultaneamente mostrar a todos aqueles que ainda acreditam no milagre grego ou europeu que tais medidas são a única coisa que resta ser feita pelas pessoas que não reúnem a coragem para pôr em questão o todo, a totalidade social.
Conclusão
A verdadeira conclusão pode ser apresentada de certo modo breve e vertida num formato de tabela simples, que contém apenas sete pontos e pode representar um exemplo de outro tipo:
1. A Grécia não poderá pagar o serviço da sua dívida a médio e longo prazo sem um prejuízo económico e social ainda mais maciço;
2. A Grécia é o país da zona euro que tem mostrado a menor produtividade económica;
3. A Grécia é o país da zona euro em que podem ser sentidos mais claramente os efeitos da crise geral e global, especialmente na "população média";
4. No quadro da valorização do valor capitalista, não há qualquer possibilidade de oferecer à Grécia uma perspectiva satisfatória de melhoria sustentável da situação, seja no domínio económico, seja no domínio social;
5. Só a melhoria da situação social e financeira dos mais afectados pode ser um objectivo razoável das propostas políticas de pessoas que se julgam críticas da sociedade;
6. De tudo o que foi dito decorre que uma redução geral ou uma moratória da dívida e a preparação de um pacote social para a terceira parte mais necessitada dos residentes na Grécia seria a única exigência realista para não sucumbir a quaisquer fantasmagorias neo-liberais ou neo-keynesianas ou até mesmo de economia solidária.
É preciso deixar bem claro que as posições neoliberais-conservadoras (palavra-chave: austeridade) têm de ser de facto criticadas por causa das suas consequências profundamente anti-sociais; e também temos de esclarecer que as exigências neo-keynesianas (palavra-chave: programas de investimento) não podem deixar de permanecer tão irrealistas como desesperadas e ineficazes; não em último lugar devemos realçar particularmente que as possibilidades apontadas pelos/as representantes da economia solidária (palavra-chave: auto-gestão e projectos de vizinhança) não representam nenhuma contribuição para o problema global, por isso sendo classificadas pelos afectados como cínicas e arrogantes. De qualquer modo não resta à Grécia nenhuma escolha depois das recentes eleições …
Quem na discussão do problema Grécia for suposto acalentar fantasias grandiosas, no que diz respeito à transformação ou mesmo ao derrube do capitalismo, deve tomar nota que a melhoria da situação dos desfavorecidos deve de facto ser saudada como humanitária e também aqui merece ser apoiada, mas não está em posição de contribuir absolutamente nada para suplantar a nossa formação social!
(1) Συνασπισμὀς Ριζοσπαστικἠς Αριστερἁς, em Português: Coligação da Esquerda Radical ("SYRIZA" de forma abreviada nos média).
(2) O chamado eurogrupo é constituído pelos seguintes países: Bélgica, Alemanha, Estónia, Finlândia, França, Grécia, Irlanda, Itália, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Holanda, Áustria, Portugal, Eslováquia, Eslovénia, Espanha e Chipre.
(3) Isto é, sem o serviço da dívida.
(4) Ou seja, a saída da Grécia do euro, que seria apoiada também justamente pelos partidos de esquerda...
(5) Os bancos e companhias de seguros privados contribuíram para o efeito, renunciando a cerca de 37 mil milhões de euros dos seus empréstimos em 2011 – podendo, porém, transferir as respectivas responsabilidades para o Estado grego.
(6) Em rigor isto aplica-se a muitos países em todo o mundo!
(7) Uma ideia verdadeiramente horrorosa para os/as estatísticos/as e construtores/as civis, bem como para os/as funcionários/as do fisco na Alemanha: apenas até 2020 terá de haver na Grécia um registo predial – por outras palavras, até lá, nada!
(8) Todos os números relativos às consequências sociais são tirados de: http://www.zeit.de/wirtschaft/2013-07/griechenland-sparen-krise/seite-2; acesso em 01.09.2015; DIE ZEIT refere-se aí ao especialista da ONU para a pobreza, Cefas Lumina, a Dimitris Asimakopulos, presidente da Associação de Pequenos Empresários Gregos, à Associação Grega da Câmara de Comércio e Indústria, bem como à própria pesquisa.
(9) Mais ou menos isso presumia DIE ZEIT em Julho de 2013.
(10) Esses centros são: América do Norte, Japão, China Oriental, Taiwan, Singapura, Coreia do Sul, Reino Unido, França, Benelux, Alemanha, Áustria, Suíça, Norte da Itália, Escandinávia.
(11) Por periferia entendo: África, grande parte da Ásia Ocidental e Central, América do Sul sem o Brasil.
Original Vor welcher Wahl steht Griechenland nach der Wahl? Πἁντα ῥεῖ – nur in Griechenland nicht? em http://www.exit-online.org em 25.09.2015