Robert Kurz

Cara leitora, caro leitor,

…os tempos estão a ficar mais difíceis, os espaços estão a ficar mais apertados. Justamente agora, que ela seria mais urgente, a reflexão crítica está a ter a pior conjuntura de todos os tempos. As restrições fazem-se sentir, já mesmo exteriormente: bibliotecas e livrarias são encerradas, taxas drasticamente aumentadas, programas falados na rádio são reduzidos, suplementos de fim-de-semana suspensos, redactores despedidos. A KRISIS é um projecto de luxo da crítica radical, disso não podemos viver. Por isso sentimos de forma dolorosa o desaparecimento das possibilidades também como organizadores e produtores teóricos, que se reproduzem na maior parte como publicistas e jornalistas ou em instituições culturais.

Mas os indivíduos e as instituições reagem à crise manifesta maioritariamente de forma regressiva, também em termos de conteúdos. As análises de autores da KRISIS foram consideradas "interessantes" por muitos, enquanto a decadência social não foi sentida de perto. Agora que os nossos prognósticos se confirmaram em grande parte, as portas dos media burgueses, instituições académicas e estabelecimentos de formação, estão a fechar-se, em vez de abrir-se mais. Redactores ou representantes institucionais antes benévolos estão tão ocupados com a própria sobrevivência, que já não têm tempo nem atenção para um pensamento para além do princípio da realidade capitalista.

Ao contrário disto a irradiação dos conteúdos da KRISIS tem-se alargado. A nossa crítica consequente do moderno sistema produtor de mercadorias há muito que já não é um conselho secreto de intelectuais. As quantidades de assinaturas estão a subir, na verdade lentamente, mas constantemente. Sobretudo aumentou repentinamente a consideração fora do espaço linguístico alemão. Há contactos íntimos com intelectuais, grupos activistas, editoras e revistas, sobretudo no Brasil, França, Itália, Espanha e Portugal. O "Manifesto contra o trabalho" não conseguiu só uma tiragem alemã de 10.000 exemplares; também foi traduzido em numerosas línguas. O "Livro negro do capitalismo" acabou de sair na China; após várias antologias de textos da KRISIS em países de língua latina, está agora em preparação também uma colectânea para uma editora britânica. A lista poderia continuar.

Todavia, simultaneamente, mostra-se que as reacções regressivas são quase ainda mais violentas na esquerda do que no empreendimento burguês geral. Justamente a esquerda radical, cuja essência histórica foi a "luta pelo reconhecimento" do trabalho assalariado como sujeito do valor, agarra-se às categorias do sistema produtor de mercadorias. E especialmente violenta é a rejeição do novo paradigma da crítica do valor na esquerda da RFA. Hoje a KRISIS é provavelmente mais conhecida e reconhecida no Brasil do que neste país.

Na Alemanha e na Áustria há por um lado o belicismo pró-ocidental dos chamados anti-alemães, que tenta bloquear uma transformação crítica-do-valor do pensamento orientado pela teoria de Marx. A nossa polémica contra esta ideologia de crise da subjectividade do valor de "esquerda" (por ex., "Scharfe Schafe" - ‘Ovelhas bicudas’, "Die Antideutsche Ideologie" – ‘A ideologia anti-alemã’) tem provocado uma campanha anti-alemã demagógica e suja contra a KRISIS e pessoalmente contra os nossos autores, que começa a agudizar-se excessivamente. Por outro lado parece estar a formar-se também, contra a exigência de uma crítica radical da socialização pelo valor e da relação de separação dos sexos, uma aliança certamente profana dos corifeus gastos de ontem e de anteontem com os esquerdistas pós-modernos da cultura e do movimento. Mais de uma década depois do colapso do socialismo estatal e do marxismo do movimento operário, reaparecem os por nós já então chamados "dinossauros" de uma esquerda tradicionalista tornada obsoleta. Na crise categorial da forma capitalista, fazem-se notar mais uma vez a teologia do valor do pensamento iluminista, o curto sociologismo das classes, a ilusão democrático-jurídica e a idealização da esfera da circulação com refinamento ideológico. E há também alguns jovens esquerdistas que procuraram salvar-se intelectualmente neste Parque Jurássico do marxismo do trabalho, da mais-valia e do iluminismo.

O crescente interesse de um público mais vasto pelo conteúdo da formação da teoria crítica do valor e da separação contrasta flagrantemente com a redução das condições materiais exteriores e do espaço publicista. A maior parte da imprensa de esquerda no espaço linguístico alemão está hoje ocupada por posições regressivas. Têm a palavra formalmente aqueles que menos têm a dizer em termos de conteúdo. Em parte fomos nós próprios que rompemos em especial com os periódicos contaminados pelo belicismo; em parte, e após 15 anos de formação da teoria crítica do valor, um sórdido maquiavelismo barato duns que queriam ser potentados politicistas, de marxistas académicos do movimento operário prontos para a aposentação e de alguns jovens dinos de criação póstuma, faz novamente a ridícula tentativa de excluir friamente a KRISIS do discurso remanescente da "crítica social" da RFA e de ensaiar a "revolta dos cadáveres" (Franz Schandl).

É claro que este esboço da actual constelação no jornalismo e no espaço do discurso da esquerda tem algo em vista. Temos boas razões para crer que as nossas leitoras e os nossos leitores dão importância à formação da teoria da KRISIS. Nos últimos anos houve tantas respostas positivas que não será arrojado pedir agora um apoio reforçado. Isto também não é um apelo qualquer, mas muito concretamente formou-se uma situação tal que o destino futuro da crítica social radical se decidirá nos próximos anos.

Será decisivo agora, que o relacionamento da KRISIS vai na ofensiva, ganhar influência publicista, alargar os contactos internacionais e começar a fazer de forma mais enérgica do que antes concorrência aos ocupantes de posições de um marxismo velho e desgastado, categoricamente apático e sem vontade de discutir. Trata-se aí não de uma guerra de seitas, que nós não vamos fazer, mas sim de uma difusão ofensiva de posições e análises da crítica do valor e da separação. Não queremos impor-nos mostrando poder, mas sim procurar uma discussão aberta também com outros princípios teóricos. Para isso, todavia , são precisos pelo menos dois.

Em termos de conteúdos estamos inteiramente preparados para tal. Torna-se agora uma exigência urgente armar publicistica e logisticamente a KRISIS, em estreita relação com a Streifzüege. Para isto precisamos muito mais do que até agora do teu/vosso empenho financeiro, organizativo e pessoal. De que precisamos é de uma data de donativos singulares maiores, para obter uma melhor base financeira para um procedimento ofensivo. Do que precisamos é de novos membros e apoiantes do círculo de leitores mais vasto, e dum aumento das contribuições regulares já existentes. Do que precisamos é duma quantidade significativa de novos assinantes que apenas as e os leitores podem adquirir para a KRISIS e a STREIFZUEGE. Do que precisamos é de pessoas que apoiem a nossa divulgação, que desbloqueiem apoios financeiros institucionais, convites a conferencistas, etc., ou nos sejam úteis de outra maneira (p.ex. através da exploração de possibilidades de publicação, através da pressão sobre posições de esquerda em redacções e instituições). Do que precisamos é de mediadores, que fundem círculos de leitura ou introduzam a teoria crítica do valor noutros contextos e entrem em contacto com a KRISIS. Portanto: tomar posição! Encorajar-nos! Apoiar! Dar! – Obrigado!

Com os melhores cumprimentos

Robert Kurz pela redacção da KRISIS

Original alemão Liebe Leserin, lieber Leser, em KRISIS 27, Novembro de 2003 www.krisis.org.

Tradução de Nikola Grabski

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