A INGLATERRA PERANTE O MAU ACORDAR

Robert Kurz

A crise da terceira revolução industrial é global, mas assume aspectos e formas de desenvolvimento diferentes em cada país. De facto, a economia e o novo capitalismo financeiro transnacionais seguem em toda a parte a mesma lógica; contudo, a administração da crise, à excepção do imperialismo securitário supranacional, mantém-se circunscrita ao espaço estatal nacional e é modificada de acordo com as respectivas estruturas institucionais e sedimentações históricas. Com isto caminha-se gradualmente para uma convergência dos sistemas sociais, em que cada aparelho de estado adopta os mais refinados métodos e invenções da barbárie social dos outros países. Assim, a tradição anglo-saxónica de radicalismo de mercado forneceu modelos essenciais para as medidas de trabalho coercivo, baixos salários e particular dureza contra jovens desempregados e mães solteiras.

A Grã-Bretanha foi descrita como modelo neo-liberal no interior da UE. As reformas Thatcher, zelosamente prosseguidas pelo primeiro-ministro Tony Blair, há muito produziram uma camada alargada de miséria e pobreza, a um nível na RFA só visado com o Hartz IV e a planeada subida do IVA. Muito antes que na Europa continental, a administração da crise britânica retocou com requinte a estatística do desemprego em massa e promoveu uma profunda divisão social. A economia foi desindustrializada e adaptada à prestação de serviços financeiramente apoiados como em nenhum outro país da Europa ocidental, a "formação de elites" foi reforçada e o sistema de ensino público abandonado à degradação. Assim se pôde fazer aparecer por magia a cintilante fachada de um boom consumista, que no entanto só abrangeu a camada média e superior. Pilares centrais desta conjuntura aparente, além do investimento financeiro na circulação, eram o factor maravilha do petróleo do Mar do Norte (que desempenhou um papel semelhante ao da economia do armamento nos USA) e a especulação imobiliária. Grande parte da classe média britânica é detentora de casa própria e, apesar do endividamento crescente, tem podido financiar o consumo com hipotecas, graças à continuada subida dos preços das casas.

Agora a fachada começa a desmoronar-se. O "ouro negro" do Mar do Norte viveu ainda assim uma espécie de Verão de S. Martinho com o aumento do preço do petróleo, mas as reservas esgotam-se a olhos vistos, e o chanceler do tesouro viu-se forçado, perante a desastrosa situação do orçamento de estado, a uma taxação exorbitante da indústria petrolífera, cujo investimento na extracção dos restos fica assim estrangulado. Simultaneamente, a especulação imobiliária com preços em queda prepara-se para uma aterragem desastrosa. Com isto também a classe média britânica está perante a queda e a crise social escondida rompe à superfície do mundo das fábulas económicas. As taxas de crescimento há muito tempo estranhas, após uma década de boom especulativo minoritário, aproximam-se do baixo nível da Europa continental. Enquanto as vendas estagnam, agora também os pequenos comerciantes britânicos se viram para batalhas de descontos devoradoras dos lucros. Comércios de móveis e de materiais de construção fecham. A "Handelsblatt" prognosticou a "ressaca após a embriaguês do consumo". O smart primeiro-ministro Blair, agarrado ao lugar, ainda pode sofrer o seu Waterloo político-económico antes do fim da legislatura. Acabou-se a pólvora do "New Labour" e o seu desencanto aguarda com ansiedade um novo "milagre" neoliberal.

Original BRITANNIEN VOR DEM BÖSEN ERWACHEN, Neues Deutschland,16.12.2005

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