À BEIRA DE UMA NOVA CRISE MONETÁRIA MUNDIAL?
Por muito paradoxal que isso possa parecer, a globalização do capital está em contradição com o dinheiro. Pois, tal como não pode haver um Estado mundial, tão pouco pode haver um dinheiro imediatamente mundial. Só pode haver dinheiro na forma de moeda, fundada numa nação ou numa região mundial, regulada pelos respectivos bancos emissores. Até à primeira guerra mundial isso não constituía problema, porque as moedas mais importantes continuavam ligadas ao padrão-ouro e por isso as taxas de câmbio eram bastante estáveis. Quando o padrão-ouro universal se desmoronou, na época das guerras mundiais e das crises económicas, deixou de haver qualquer medida para a relação entre as moedas e assim o mercado mundial entrou em colapso. Foi em 1944, na estância americana de desportos de Inverno, Bretton Woods, que se estabeleceram os fundamentos para uma ordem económica mundial no pós-guerra. O dólar, como nova moeda de reserva e de comércio mundial, devia possibilitar um sistema de câmbios fixos. A estabilidade desse sistema estava garantida pelo facto de o dólar ser a única moeda convertível em ouro.
Nesta base cresceram rapidamente o comércio mundial e a exportação de capital. Todavia, com isso os Estados Unidos perderam a sua superioridade absoluta como estado industrial e exportador. As reservas de ouro de Fort Knox derreteram-se. Em 1973 o sistema de Bretton Woods teve que ser denunciado. As taxas de câmbio entraram em oscilações incontroláveis. Esta crise monetária mundial apenas pode salvar-se do descalabro porque, apesar de tudo, o dólar manteve-se como moeda mundial. Agora, porém, o seu único fundamento irracional era a posição dos Estados Unidos como potência militar mundial ("porto seguro"). Quando nos anos oitenta o déficit da balança de transacções dos Estados Unidos transbordou, sobretudo face ao Japão, o dólar ameaçou cair em flutuações incontroláveis, o que ainda foi travado pelos acordos dos principais bancos emissores ocidentais. Mas o problema continuou a enfunar-se. Entretanto, já não há nenhuma região do mundo que não apresente crescente superavit na balança de transacções com os Estados Unidos. Depois do Japão e dos tigres asiáticos, é sobretudo a máquina exportadora chinesa, construída pelos conglomerados transnacionais, que impulsiona o enorme volante do circuito do déficit do Pacífico e com ele a conjuntura mundial.
O déficit da balança de transacções dos Estados Unidos quase duplicou desde os anos oitenta. Segundo os manuais de economia política este "desequilíbrio" sem paralelo tem de ser corrigido com um cataclismo nas relações das taxas de câmbio. Porém, com uma desvalorização drástica do dólar e uma correspondente valorização das moedas asiáticas, não só se deteria abruptamente o rolo compressor das exportações, mas também se desvalorizariam as astronómicas reservas de divisas do Japão e da China; e seria de esperar um surto inflacionista nos Estados Unidos. É por isso que as moedas asiáticas são mantidas artificialmente baixas com intervenções dos bancos emissores e assim se vai andando. Porém o euro sobe, tal como o preço do ouro. Até agora estes sinais de alarme têm sido menosprezados. Uma vez que o euro não tem "cobertura", nem de ouro, nem de uma máquina militar superior, continua a ser mais que duvidoso que ele possa substituir o dólar como moeda de reserva e de comércio mundial (mesmo isso seria acompanhado de turbulências incalculáveis). Quanto mais tempo se protelar a correcção das taxas de câmbio na Ásia, mais provável se torna uma "aterragem brusca" do dólar e com ela uma nova crise monetária mundial incontrolável. E assim cairia também por terra a novíssima e esplendorosa retoma.
Original VOR EINER NEUEN WELTWÄHRUNGSKRISE? in www.exit-online.org. Publicado em Neues Deutschland, 04.05.2007