O universo
económico paralelo
A época de simulação
designada cultural e ideologicamente como "pós-moderna" e
economicamente como "neoliberal" está a chegar ao seu fim vergonhoso.
O comportamento lúdico perante o mundo desfaz-se contra a dura realidade dos
factos. No plano do capital fictício, o crash financeiro global já fez
recordar incomodamente a realidade reprimida da valorização substancial do
capital. Pelo contrário, o universo tecnológico paralelo do virtualismo, a
multifacetada "Second Life" da Internet, parece gozar duma existência
animada. Dos 7 mil milhões de pessoas em todo o mundo somente 1,6 mil milhões
são "utilizadores" da net; sendo que a maior parte destes
utilizadores, 298 milhões, encontra-se na China, representando no entanto
apenas 22 por cento da população local. No espaço público global o debate
sobre a Internet assume uma dimensão desproporcionada, como se a vida real da
esmagadora maioria da população mundial fosse irrelevante. Entretanto, com o
crash das Dotcom no virar do século, já se desmoronaram as ilusões sobre a
viabilidade independente da economia virtual da Internet.
De facto, o universo
tecnológico paralelo está estreitamente interligado com a conjuntura de bolhas
financeiras em dissolução. Só desta forma se pôde desenvolver nos
"utilizadores" a mentalidade hipócrita do grátis, como se no meio do
capitalismo pudesse haver uma zona sem custos. A partir da esquerda, surgiu a
expressão de "slogans" como "O download é o comunismo." Gráficas,
editores e livreiros estão a ser destruídos. Mas, para além da degradação
cultural, que vem acompanhada duma avalanche de inconsciente tagarelice
blogueira, a fuga para a Net tem o seu preço. Na realidade, a suposta ausência
de custos dos conteúdos baseia-se na expansão da indústria da publicidade. As
emissoras privadas, com suas agressivas interrupções publicitárias, são
meninos do coro em comparação com a oferta de conteúdos da Internet. Mesmo no
caso da mídia virtual alternativa de esquerda tem de se passar pela publicidade
a veículos automóveis, loções perfumadas, extensões do pénis e outros
produtos obscuros. Essa degradação dos conteúdos mostra a capitulação
perante a constituição capitalista e não só. Na Internet nada é produzido,
apenas publicitado. Até os fornecedores do acesso a este universo paralelo estão
totalmente dependentes da publicidade. Se as vendas dos produtos anunciados caírem,
também os orçamentos de publicidade na Internet recuarão.
É previsível, também,
uma segunda "aterragem" do campo de jogos virtual. O click grátis
exige um grande agregado de infra-estruturas, com elevado consumo de energia,
para cuja instalação a maioria dos países não tem capacidade financeira. Por
isso, há limitações à expansão da rede; é provável que o seu zénite já
tenha sido ultrapassado. Mas, mesmo nos centros capitalistas, a falência ainda
latente das finanças do Estado, na sequência da gestão da crise, põe em
questão a médio prazo a oferta do serviço em todo o território. O acesso à
Net pode sofrer cortes, tal como a assistência médica; o que se aplica a
fortiori aos sectores privatizados. O "grátis" poderá revelar-se
muito caro se a ligação só for possível através de elevados custos de
acesso. Mesmo a "Second Life" não é arbitrária, aberta,
contingente, ambivalente etc., mas pertence unha com carne ao sistema fechado da
lógica da valorização. Está eminente para os "utilizadores" a
experiência de que ainda vivem no mundo material do capitalismo, que só pode
ser abolido ou todo ou nada.
Original
DAS
ÖKONOMISCHE PARALLELUNIVERSUM em www.exit-online.org.
Publicado no Neues Deutschland de
14.08.2009