Udo Winkel
A editora Westfälische Dampfboot publicou a 3ª edição de Libido und Gesselchaft. Studien zu Freud und der Freudschen Linken [Libido e sociedade. Estudos sobre Freud e a esquerda freudiana] de Helmut Dahmer. A primeira edição deste clássico saiu em 1973. Escreve Dahmer na nova nota prévia: “Os leitores interessaram-se obviamente sobretudo pela história crítica da relação entre psicanálise e marxismo, e menos pelo seu pressuposto, a nova interpretação (sociológica) de Freud.” (p. 7) Eu também li a obra então e posso confirmar Dahmer. É preciso não esquecer que as primeiras edições piratas então surgidas foram a Psicologia de massas do fascismo de Wilhelm Reich e o seu estudo sobre Materialismo Dialéctico e Psicanálise. Para Dahmer, hoje, trata-se sobretudo de “despertar também o interesse pela metade esquecida da teoria de Freud, a crítica da cultura, portanto pelas implicações sociais da psicanálise” (p. 7).
Dahmer encabeça a sua introdução “Teoria Crítica como Ciência Natural” com uma citação de Walter Benjamin: “Em cada época, é preciso arrancar a tradição ao conformismo, que quer apoderar-se dela.” “A psicanálise não se conhece a si mesma, só que o seu incógnito há muito está descoberto, contra a resistência do bon sense cientificista. Desde o início que não era clara a relação entre os trabalhos clínicos e metapsicológicos de Freud, por um lado, e os seus escritos sobre a teoria da cultura, por outro. Estes últimos são considerados pela maioria dos psicanalistas como simples ‘aplicação’ da psicanálise pura, e pelo marxismo oficial como ultrapassagem da competência de uma psicologia clínica na melhor das hipóteses medicamente aceitável, enquanto empresa concorrente na ideologia. Mesmo os psicanalistas de orientação marxista dos anos vinte e trinta (excepto Bernfeld) a rejeitaram. Th. W. Adorno e depois H. Marcuse inverteram a tese de Freud de que a sociologia seria psicologia aplicada e evidenciaram o conteúdo de experiência social dos escritos de Freud sobre metapsicologia e teoria da cultura” (p. 21-22)
Trata-se do “produzir inconsciente, da alienação e da sua possível superação através da apropriação memorizada. A tal desdobramento da filosofia encapsulada nos conceitos de Freud opõe-se o entendimento actualmente dominante entre os psicanalistas da terminologia freudiana como uma linguagem especializda pensada para fins clínicos… Assim a nova interpretação da psicanálise, que rompe com o seu mal-entendido cientificista e caracteriza a psicanálise como procedimento dialecticamente hermenêutico, partiu essencialmente de não-psicanalistas, de filósofos e cientistas sociais” (p. 22).
Os “Estudos sobre Freud e a esquerda freudiana” partem do nível de esclarecimento atingido pelos trabalhos aí mencionados. Na 1ª Parte, “Psicanálise e teoria social”, inspirada sobretudo pela interpretação de Freud da Escola de Frankfurt, é empreendida a tentativa de ler os escritos de Freud no seu conjunto como teoria social sui generis, na esperança de aprofundar o conhecimento da condicionalidade social da sua psicologia e de levar mais longe a historicização das categorias psicanalíticas” (p. 23).
A 2ª Parte, “Sándor Ferenczi e os problemas da psicanálise”, mostra como estes se exprimem nos seus escritos. Na 3ª Parte, “Psicanálise e marxismo”, após uma introdução relembrando “a rejeição da psicanálise pelo marxismo oficial tendo por base a sua tradição antipsicológica e a transformação da teoria crítica de Marx numa ideologia legitimadora”, são expostas e criticadas as “tentativas da primeira geração da ‘esquerda freudiana’ (Siegfried Bernfeld, Wilhelm Reich, Eric Fromm, Otto Fenichel) de combinar marxismo e psicanálise.” (p. 23)
Na 4ª parte segue-se a „Alegação em defesa de uma nova psicologia social analítica”: “Só tendo por fundo uma adequada ideia da estrutura e das tendências de desenvolvimento da sociedade actual se pode caracterizar o significado das histórias de vida (histórias de casos). Mas a aquisição de conhecimentos sociológicos pressupõe uma reforma da formação psicanalítica que vise actualizar e continuar a ensinar novamente a parte esquecida do desenvolvimento de Freud, a sua teoria crítica da cultura, que foi vítima da medicalização da psicanálise.” (p. 386-387) Sabemos hoje que a esperança de Dahmer não se concretizou.
Num aditamento à 3ª edição é abordada a “Restituição da teoria crítica”: “Atrás de nós fica um século bárbaro, cheio de crimes horríveis, pelos quais ninguém quis ser responsabilizado. A via para uma ‘Associação livre’, em que a ‘administração das coisas’ democrática substitua a ‘dominação das pessoas’, está bloqueada por esfinges monstruosas, cujo enigma nós ainda não solucionámos. A história da psicanálise foi até agora uma história de menosprezo e autolimitação. É tempo de lembrarmos a verdadeira intenção da informação psicanalítica: retirar a aparência natural das instituições históricas da vida e da cultura tornadas obsoletas, para possibilitar a sua revisão. ‘Libido e Sociedade’ constitui uma alegação em defesa da redescoberta da teoria de Freud como teoria crítica.”
Helmut Dahmer: Libido und Gesselchaft. Studien zu Freud und der Freudschen Linken, 3. korrigierte und erweiterte Aufl., Westfälische Dampfboot, Münster 2013, 600 Seiten, 39,99 €
Original LIBIDO UND GESSELSCHAFT Publicado na revista EXIT! Krise und Kritik der Warengesellschaft, nº 12 (11/2014), pag. 171-172, [EXIT! Crise e Crítica da Sociedade da Mercadoria, nº 12 (11/2014)], ISBN 978-3-89502-374-3, 192 p., 13 Euro, Editora: Horlemann Verlag, Heynstr. 28, 13187 Berlin, Deutschland, Tel +49-(0)30 49307639, E-mail: info@horlemann-verlag.de, http://www.horlemann.info/.